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quinta-feira, 20 de novembro de 2025

20 de novembro - O primeiro Zumbi a gente nunca esquece - Por Roberto Muggiati

 Não há como esquecer. O Dia da Consciência Negra, na data do aniversário da morte de Zumbi dos Palmares, foi comemorado pela primeira vez no Rio de Janeiro em 20 de novembro de 1995.  O feriado municipal, decretado pelo prefeito Cesar Maia, foi cercado de controvérsias, mas acabou respeitado naquela segunda-feira chuvosa em que a Manchete em peso compareceu ao enterro de Adolpho Bloch no Cemitério Israelita de Vila Rosali, em São João de Meriti.


Internado num hospital de São Paulo, Adolpho morreu nas primeiras horas do domingo, 19 de novembro de 1995, Dia da Bandeira. “O Rei morreu”, era o pensamento na cabeça dos jornalistas que foram aguardar o corpo para o velório no saguão de entrada do prédio da Bloch no 804 da Rua do Russell. O clichê imemorial não foi completado com o “Viva o Rei!” Adolpho não deixava herdeiro à sua altura. O mais afoito candidato, Oscar Bloch Sigelmann, morrera na véspera do Carnaval daquele ano. Num ano ruim para os Bloch, em agosto, foi a vez da irmã de Adolpho, dona Bela, mãe do Jaquito.

Naquele domingo, fui convocado para dar depoimentos à TV sobre Adolpho, principalmente na Rede Manchete. Ainda ficamos um tempo na redação, esboçando o fechamento da revista naquela segunda-feira – seria quase uma edição especial sobre Adolpho.

Chovia torrencialmente. Fizemos a longa viagem de trinta quilômetros até Vila Rosali – Lena e eu – no carro do casal Norma e Murilo Melo Filho, com direito a motorista particular. A presença de Xuxa (que ganhara fama e acesso à TV Globo graças à Manchete), Angélica, Cristiana Oliveira da novela Pantanal e outras celebridades atraiu a tietagem local, mesmo debaixo do aguaceiro. Para conseguir uma visão melhor, havia gente sentada até no muro do cemitério. Uma pequena multidão de fieis se acotovelava junto ao túmulo de Adolpho Bloch na hora do enterro.

Procurando um ângulo melhor, o fotógrafo Nilton Ricardo subiu num túmulo vizinho e Jeová o fulminou no ato pelo sacrilégio com um tombo quase fatal – Nilton se safou agarrando-se a uma lápide, que cedeu, levando consigo na queda uma meia dúzia de outros fotógrafos.

Do meu lado, Arnaldo Bloch, sobrinho-neto de Adolpho, me explicava o simbolismo da linha férrea que margeia o cemitério. Quando um corpo acaba de ser enterrado passa sempre um trem. Não deu outra: mal os despojos de Adolpho Bloch eram cobertos pela tampa da sepultura, um trem se deslocou lentamente no horizonte como uma longa cobra.

Capa: Foto de Sergio Zalis
Voltamos de carona com o Mauro Costa, chefe de reportagem da televisão. Ainda chovia forte.

Às dezenove horas começamos o fechamento da revista, que varou a noite. Na capa, um belo retrato de Sérgio Zalis do homem que havia criado a Manchete havia 43 anos.

Os cariocas mais afortunados gozavam as últimas horas de lazer que lhes foram conferidas, pela primeira vez, por Zumbi dos Palmares.



FOTOMEMÓRIA DA REDAÇÃO
Hall do prédio do Russell, manhã de 20 de novembro de 1995. Já com a missão de fechar o número especial da Manchete em homenagem ao seu fundador, parte da redação fez uma pausa para receber o corpo de Adolpho Bloch, transladado de São Paulo. Na foto, João Silva, Regina, Orlandinho, Alberto, José Carlos, Muggiati, Cesar, Ney Bianchi, José Esmeraldo, Paulinho e Pinto. 

sábado, 20 de novembro de 2010

Glória aos piratas...

(Foto:Reprodução/Globo, edição de hoje)
por José Esmeraldo Gonçalves
O Globo de hoje - Dia da Consciência Negra - publica uma excelente matéria sobre a Revolta da Chibata, que completa 100 anos na segunda-feira, 22. Assinado pelo jornalista Flávio Henrique Lino, o texto relata a garra e o drama do grupo de marinheiros liderados pelo negro João Cândido Felisberto que assumiu o controle do couraçado Minas Gerais, um dos mais poderosos navios de guerra da época, em 1910. Flávio compara a revolta, que durou seis dias, ao motim do encouraçado Potemkim que desafiou a Rússia imperial em 1905. Mas o próprio repórter alerta que a Revolta da Chibata não buscava um objetivo político direto mas o fim dos castigos corporais a bordo dos navios da Marinha de Guerra.
O Brasil celebra - João Cândido saiu da sua luta como o Almirante Negro - e a Marinha até hoje ignora as comemorações da data. Para os oficiais que aplicavam as chibatadas e para o comando elitista da Armada, o episódio foi uma derrota. À frente de um tripulação de mais de mil homens, o Almirante Negro apontou 120 canhões para a cidade. O governo cedeu e foi obrigado a mudar a lei e acabar com a crueldade dos castigos. Mas a vingança oficial não demoraria a vir. O governo Hermes da Fonseca logo descumpriu o decreto de anistia e prendeu alguns marinheiros rebeldes na Ilha das Cobras. Menos de 20 dias depois, sobre pretexto de um levante de fuzileiros, bombardeou a ilha. A ação resultou em cerca de 500 mortos. Flávio conta que João Cândido, que se declarou contra essa revolta dos fuzileiros, foi preso e jogado em uma cela empapada de cal. Dos 18 ocupantes da masmorra, apenas dois sobreviveram. Um deles, o Almirante Negro, que morreu em 1969, em plena ditadura, sem ver reconhecidos os heróis da Revolta da Chibata.
O episódio diz muito sobre a luta do Brasil contra o racismo. Apenas os dois últimos presidentes, na longa história de República, promoveram ações efetivas nesse campo.
O primeiro Presidente da República a reconhecer publicamente que o Brasil tem estruturas sociais e culturais que produzem racismo foi Fernando Henrique, que atendeu à Primeira Marcha Zumbi dos Palmares contra o Racismo, pela Igualdade e pela Vida (o movimento levou 30 mil pessoas a Brasília) e criou, no seu primeiro governo, o Grupo de Trabalho Interministerial para a Valorização da População Negra. Isso aconteceu em 1995. O presidente Lula criou depois a Secretaria Especial de Políticas e Promoção da Igualdade Racial. Mas há fortes bolsões de resistências a essas políticas ainda incipientes. O recente Estatuto da Igualdade Social, um iniciativa importante, foi aprovado pelo Congresso mas saiu desfigurado pela intervenção das bancadas da direita e de representantes da elite conservadora do país. A política de cotas para as universidades continua aí sob bombardeio. E a recente campanha eleitoral mostrou que o racismo está vivo e atuante na sociedade e é um crime a ser punido.
Segundo os documentos históricos, hoje é o dia em que Zumbi dos Palmares foi capturado e morto. A data tem um forte simbolismo. Merece reflexão. Mas a realidade ainda exige que o Brasil se mexa para vencer o preconceito.
Duvida? Pois o IBGE constata que quem nasce negro no Brasil tem menor expectativa de vida, mais dificuldade de se empregar, salários em média mais baixos, e acesso mais difícil à saúde e à educação em todos os níveis.
Dia da Consciência Negra. Dia de ouvir a genial "Mestre-Sala dos Mares", de João Bosco e Aldir Blanc, na voz de Elis Regina.
A censura da ditadura militar nos anos 70 obrigou os autores a mudar a letra. Os militares cassaram a expressão "Almirante Negro" que, na letra liberada virou "Navegante Negro", "Bravo marinheiro" virou "Bravo feiticeiro" e "ao navegar pelo mar com seu bloco de fragatas", da letra original, transformou-se pela força da tesoura em "e ao acenar pelo mar na alegria das regatas". A ditadura e os censores são degetos da História; a canção de João Bosco e Aldir Blanc permanece. Ouça Ellis.

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