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sábado, 10 de novembro de 2018

E lá se foi o pai do chabadabadá. . . • Por Roberto Muggiati

Francis Lai (à direita) e Claude Lelouch, em 2016. Foto Champs-Élyséees Film Festival. 


por Roberto Muggiati 

O cara era tão importante que sua morte foi anunciada pelo Prefeito de Nice, na última quarta-feira, 7 de novembro. Francis Albert Lai, filho de hortigranjeiros italianos nascido em Nice, era apenas um obscuro músico de boate em Paris quando o sucesso o atropelou para o resto da vida em 12 de julho de 1966, dia em que foi lançado o filme de Claude Lelouch, Um homem, uma mulher, com a trilha sonora assinada por Lai.

A musiquinha tema do filme era dessas que grudam, com seu refrão chabadabadá, chabadabadá entoado por um corinho feminino. Quem entende das coisas e conhece bossa nova viu logo a influência das primeiras frases de O Barquinho, composto na virada de 1960-61 por Roberto Menescal e Ronaldo Bôscoli, letrista literalmente foragido da sala de reportagem da revista Manchete. Experimentem colocar um chabadabadá-chabadabadá logo no início da música no lugar de “e o barquinho a deslizar no macio azul do mar.” Aliás, o namoro com a bossa nova era aberto: o filme de Lelouch traz também na trilha o Samba da bênção, de Baden e Vinícius, traduzido e cantado em francês por Pierre Barouh e rebatizado de Samba Saravah.

O oposto do discurso político de Jean-Luc Godard, Claude Lelouche fazia um cinema digestivo no estilo dos comerciais de televisão. (Muitos o chamavam de Le Louche – “louche” em francês quer dizer “vesgo”, mas tem o sentido figurado de “duvidoso”, “inconfiável”.) Lai fazia uma música agradável, fácil de digerir, coisa também de anúncio de TV.

Mas não posso deixar de admitir que uma das canções que mais evoca para mim a atmosfera eufórica e inocente do Ano da Flor, 1967, é o seu tema para outro filme de Lelouch, Viver por viver. A história é um triângulo amoroso entre Yves Montand, correspondente de guerra, sua mulher (Annie Girardot) e a amante (Candice Bergen) – todos no auge do seu charme e beleza. (Cinco anos antes Godard filmou Vivre sa Vie: a semelhança com Vivre pour vivre é brutal, Lelouch gostava de cutucar o suíço...) Enfim, vão longe os doces tempos do chabadabadá, hoje o que temos é o blábláblá dos medíocres que nos oprimem e o ratatatatá da violência que corre solta.

Para ouvir as canções:

Um homem, uma mulher AQUI
O Barquinho AQUI
Viver por viver AQUI

sexta-feira, 14 de outubro de 2016

Deauville: 50 anos depois, o set onde Claude Lelouch filmou "Um homem e uma mulher"

por José Esmeraldo Gonçalves

Algumas cidades ganham links irremovíveis que remetem a filmes antológicos.

Impossível ir a Casablanca e não lembrar de Humphrey Bogart e Ingrid Bergman, embora o filme clássico tenha sido rodado inteiramente em estúdio apenas com a inserção de umas poucas cenas do Marrocos real.

De Paris, Roma e Nova York nem se fala tantas são as referências cinematográficas.

O mundo só ouvia falar de Stromboli, a 70 km de Nápoles, quando o vulcão local entrava em erupção. Mas a pequena ilha se tornou definitivamente famosa e passou a atrair turistas quando o diretor Roberto Rosselini a transformou em set para Karen (Ingrid Bergman) e o pescador Antonio (Mario Vitale). Hoje, Stromboli, a ilha, e Stromboli, o filme, ainda se confundem no imaginário dos visitantes.

Há centenas de exemplos. Deauville, na Normandia, também tem o filme da sua vida: "Um homem e uma mulher", de Claude Lelouch.

Balneário sofisticado, a cidade sedia um importante festival de cinema, tem um cassino que atrai parisienses desde o começo do século passado e recebe corridas de cavalo milionárias. Mas cabe a Les Planches, as famosas passarelas de madeira que emolduram a areia banhada pelo Atlântico Norte, levar os passantes ao filme de Lelouch.

Em 1966, há 50 anos, quando a nouvelle vague estava no auge, Anne Gauthier (Anouk Aimée) e Jean-Louis Duroc (Jean-Louis Trintignant) viveram naquela praia cenas de uma dramática história de amor que comoveu as plateias da década, ganhou a Palma de Ouro de Cannes, em 1966, e o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro no ano seguinte.

Em 1986, Claude Lelouch voltou a Deauville com o mesmo par central do primeiro filme para rodar "Um homem e uma mulher 20 anos depois", que não obteve o mesmo sucesso nem destronou o original na memória da cidade.

Para a maioria dos turistas, caminhar sobre o deque de Deauville é percorrer por instantes os fotogramas de Lelouch e ouvir, ainda que em play back imaginário, a célebre trilha sonora de Francis Lai.

Deauville, a praça central.

O deque em cartão postal do começo século passado. Reprodução.

Les Planches, hoje, com a homenagem a atores e atrizes em cada cabine, e...

...no filme "Um Homem e Uma Mulher" (Foto:Divulgação)

Um casal na praia ainda ensolarada, há poucos dias, neste outono de 2016 e...

... na cena, em 1966, do premiado filme de Claude Lelouch (Foto Divulgação)

Em Deauville, a homenagem ao cineasta.
Fotos de J.Esmeraldo Gonçalves