Cunha versus Dilma, 'meme' que circula nas redes sociais. Reprodução |
* Ontem e hoje, os jornais brasileiros estão temáticos: a notícia é quase que só impeachment. Talvez nem às vésperas da ditadura militar de 1964 tenham sido escritas tantas colunas em apoio à derrubada de um presidente eleito. Os colunistas políticos e de economia também foram mais contidos no episódio Collor de Mello, afinal, a mídia ajudara a eleger o "caçador de marajás". Ontem, soltaram a franga nas "pretinhas", apelido das teclas das máquinas de escrever hoje incorporado aos desktops e assemelhados. O encaminhamento da questão também foi diferente. Em maio de 1992, Pedro Collor acusou PC Farias de chefiar um esquema de corrupção como testa-de-ferro do então presidente. Em junho, a Câmara dos Deputados instalou uma CPI para investigar as denúncias. Em agosto daquele ano, a CPI concluiu que Collor tinha ligações com o Esquema PC. Em setembro, só após o fim das investigações e a aprovação do relatório da CPI, o plenário da Câmara dos Deputados aprovou a admissibilidade de um pedido de impeachment contra Collor. Em outubro, o Senado abriu o processo de impeachment e em 30 de dezembro de 1992, aconteceu a votação que destituiu o presidente. Collor, certo da derrota, havia renunciado um dia antes. O rito agora é diferente. Um certo Hélio deu um Bicudo nessa liturgia e já partiu pra cima de Dilma com o pedido de impeachment rascunhado e do tipo fast food, jogo rápido. Foi esse o documento admitido por Cunha. Era um papelucho a mais entre a cesta de pedidos semelhantes que jaziam sob a mesa do presidente da Câmara até que seu próprio rabo começou a pegar fogo. Cunha, que tem estado sob pressão, ontem teve um dia feliz: foi saudado e exaltado por dar andamento ao golpe. Coxinhas e oposição estão andando com seu retrato nas carteiras e sua imagem é proteção de tela nos mais ilustres computadores. Já se dizia que o Brasil está dividido. Agora os times ganham um novo nome; Dilma Futebol Clube x Cunha Futebol e Regatas. Suspeita-se em Brasilia que no momento em que o impeachment for realmente votado no plenário o time de Cunha passará a se chamar Cunha-Temer FR. Façam suas apostas.
* Dilma diz que vai lutar. Teoricamente, teria, hoje, maioria na Câmara e no Senado. Na prática, a teoria pode ser outra. O vice-presidente Michel Temer, por exemplo, não se pronunciou contra o impeachment. Brizola diria que ele está, já há algum tempo, "costeando o alambrado" para pinotar. Temer dá sinais de que está ao lado de Eduardo Cunha e não abre. Talvez abra apenas ao assumir a presidência. Quanto a Cunha, pode acabar ministro do novo governo, por que não?, tudo é possível. Frise-se que os adeptos do impeachment vão precisar dos votos da bancada pessoal do Cunha, que não é desprezível tanto que até aqui tem brecado a denúncia no conselho de ética - sim, existe isso - da Câmara. E já há ministro do PMDB anunciando que vai deixar o governo. A tática do PMDB é essa, desde sempre, pular da canoa para descolar um lugar no barco que vem vindo, mas, ao mesmo tempo, deixar uma tripulação no Titanic para o caso de, vá lá, o governo não cair e partido continuar botando a mão no timão. E na nave do pessoal a favor do golpe cabe de tudo, de Cunha a Bolsonaro, passando pela grande mídia, por empresários, viúvos e viúvas da ditadura, filósofos, cineastas, roqueiros, compositores, humoristas, coxinhas, pastores e bancadas da bala, do caramelo e do sorvete. Daí, a "maioria" de Dilma pode fazer água. Dias movimentados virão.
* Curiosamente, o governo quer votar o impeachment o mais rápido possível. O setor produtivo do país também, já que muitos avaliam que a economia não aguenta esperar, mas a oposição e seus analistas defendem adiar o processo e já se fala abertamente que é melhor esperar a situação piorar, o desemprego aumentar, o endividamento angustiar as pessoas, o país parar de vez, sem orçamento, Congresso obstruído etc. Eles acreditam que o caos favorecerá o golpe. A imprensa inglesa está chamando essa guerra entre Dilma e Cunha "jogos vorazes". Por aqui também é conhecida como briga de foice no escuro.
* A polícia de Geraldo Alckmin botou pra quebrar, literalmente. O PSDB tem aparentemente métodos especiais para lidar com a educação e manifestações divergentes. Nem é surpresa, o figurino é repetido. Os professores de São Paulo já experimentaram o porrete tucano. Professores do Paraná já foram massacrados pela polícia de outro tucano, o Beto Richa. Os protestos de junho de 2013, lembram?, desandaram em mais violência a partir do momento em que a PM paulista baixou o cacete. Agora, as forças tucanas deram porrada em estudantes que protestam contra o fechamento de dezenas de escolas, como parte de uma inacreditável política (des) educacional e elitista. Ontem, o ex-governador Sergio Cabral, sem que isso implique em defesa do próprio, deve ter constatado como foi injustiçado pelo Jornal Nacional. Em 2013, o JN destacava a violência da PM, caprichava na edição dramática, entrevistava manifestantes que levantam a camisa e mostravam marcas de balas de borrachas, mandava ao ar até vídeos feitos por black blocs denunciando a pancadaria. Ontem, o JN foi "fofo" na cobertura das manifestações dos estudantes em São Paulo. Evitou ênfase nas cenas de violência da PM,. não levou ao ar qualquer entrevista com manifestante ferido e privilegiou depoimentos oficiais de pelo menos três secretários de estado que também deram declarações "fofas". A informação mais recente: com a força das manifestações dos jovens, a péssima repercussão entre especialistas em educação e com a Justiça impedindo em várias cidades a "reorganização' pretendida por Alckmin, e especialmente com a brutal queda de popularidade do tucano, segundo o Data Folha, a aprovação ao governador caiu em mais de 20%, resolveu suspender, por enquanto, o desastrado projeto. Os estudantes querem ver para crer e dizem que vão permanecer mobilizados. O Secretário de Educação, Herman Voorwald, pediu demissão, já que não teria concordado com o recuo.
* De um modo geral, a mídia conservadora blindou o governador Geraldo Alckmin. A Folha recebeu a visita do próprio e, coincidentemente, retirou do ar, no site, em seguida, vídeo com cenas da violenta atuação da tropa de choque da PM. Na edição impressa, o jornalão omitiu prisão de estudantes e cacetadas policiais em meninos e meninas.
* Após mais um massacre nos Estados Unidos, Obama tenta reabrir a discussão sobre o controle de armas de fogo no país. Possivelmente, vai perder mais essa batalha. A facilidade com que americanos podem comprar pistolas, rifles, fuzis e munição tem as costas quentes e bem abastecidas do financiamento privado de campanhas eleitorais. A poderosa Associação Nacional do Rifle monta, a cada legislatura, à custa de milionárias doações de empesas, uma poderosa bancada no Congresso formada por republicanos (a grande maioria) e democratas. Até aqui, nenhum presidente conseguiu impor um mínimo de controle à comercialização de armas. Nem as poucas exigências da lei em alguns estados são cumpridas. Segundo matérias na imprensa americana, 40% das armas são vendidas sem qualquer comprovação de identidade. Houve casos em que até indivíduos arrolados em inquéritos do FBI puderam adquirir pistolas e rifles. O próximo massacre não tem data nem hora para acontecer. Só se sabe o que as estatísticas dizem: inevitavelmente, acontecerá em alguma escola, universidade, instituição pública, loja, praça ou rua. Os principais jornais avaliam que passou da hora de mudar a legislação sobre armas. E levantam uma grave questão: os Estados Unidos, que tanto controlam aeroportos, são o país onde um eventual "lobo solitário", o típico terrorista do Estado islâmico, pode adquirir armas como quem compra um big mac. As lojas de vendas de armas pessoais, como se viu na Black Friday, fazem até promoções vantajosas do tipo pague-uma-e-leve-duas. E ainda financiam o pagamento "na parcela"...