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terça-feira, 19 de novembro de 2019

O primeiro Zumbi a gente nunca esquece • Por Roberto Muggiati

Monumento a Zumbi dos Palmares, na Praça Onze, Centro do Rio. Reduto dos negros, berço do samba e
o bairro que recebeu imigrantes judeus a partir do final do Século  19. Foto: Prefeitura do Rio de Janeiro
Não há como esquecer. O Dia da Consciência Negra, na data do aniversário da morte de Zumbi dos Palmares, foi comemorado pela primeira vez no Rio de Janeiro em 20 de novembro de 1995.  O feriado municipal, decretado pelo prefeito Cesar Maia, foi cercado de controvérsias, mas acabou respeitado naquela segunda-feira chuvosa em que a Manchete em peso compareceu ao enterro de Adolpho Bloch no Cemitério Israelita de Vila Rosali, em São João de Meriti.

Internado num hospital de São Paulo, Adolpho morreu nas primeiras horas do domingo, 19 de novembro de 1995, Dia da Bandeira. “O Rei morreu”, era o pensamento na cabeça dos jornalistas que foram aguardar o corpo para o velório no saguão de entrada do prédio da Bloch no 804 da Rua do Russell. O clichê imemorial não foi completado com o “Viva o Rei!” Adolpho não deixava herdeiro à sua altura. O mais afoito candidato, Oscar Bloch Sigelmann, morrera na véspera do Carnaval daquele ano. Num ano ruim para os Bloch, em agosto, foi a vez da irmã de Adolpho, dona Bela, mãe do Jaquito.

Naquele domingo, fui convocado para dar depoimentos à TV sobre Adolpho, principalmente na Rede Manchete. Ainda ficamos um tempo na redação, esboçando o fechamento da revista naquela segunda-feira – seria quase uma edição especial sobre Adolpho.

Chovia torrencialmente. Fizemos a longa viagem de trinta quilômetros até Vila Rosali – Lena e eu – no carro do casal Norma e Murilo Melo Filho, com direito a motorista particular. A presença de Xuxa (que ganhara fama e acesso à TV Globo graças à Manchete), Angélica, Cristiana Oliveira da novela Pantanal e outras celebridades atraiu a tietagem local, mesmo debaixo do aguaceiro. Para conseguir uma visão melhor, havia gente sentada até no muro do cemitério. Uma pequena multidão de fieis se acotovelava junto ao túmulo de Adolpho Bloch na hora do enterro.

Procurando um ângulo melhor, o fotógrafo Nilton Ricardo subiu num túmulo vizinho e Jeová o fulminou no ato pelo sacrilégio com um tombo quase fatal – Nilton se safou agarrando-se a uma lápide, que cedeu, levando consigo na queda uma meia dúzia de outros fotógrafos.

Do meu lado, Arnaldo Bloch, sobrinho-neto de Adolpho, me explicava o simbolismo da linha férrea que margeia o cemitério. Quando um corpo acaba de ser enterrado passa sempre um trem. Não deu outra: mal os despojos de Adolpho Bloch eram cobertos pela tampa da sepultura, um trem se deslocou lentamente no horizonte como uma longa cobra.

Voltamos de carona com o Mauro Costa, chefe de reportagem da televisão. Ainda chovia forte.

Às dezenove horas começamos o fechamento da revista, que varou a noite. Na capa, um belo retrato de Sérgio Zalis do homem que havia criado a Manchete havia 43 anos.

Os cariocas mais afortunados gozavam as últimas horas de lazer que lhes foram conferidas, pela primeira vez, por Zumbi dos Palmares.



FOTOMEMÓRIA DA REDAÇÃO
Hall do prédio do Russell, manhã de 20 de novembro de 1995. Já com a missão de fechar o número especial da Manchete em homenagem ao seu fundador, parte da redação fez uma pausa para receber o corpo de Adolpho Bloch, transladado de São Paulo. Na foto, João Silva, Regina, Orlandinho, Alberto, José Carlos, Muggiati, Cesar, Ney Bianchi, Esmeraldo, Paulinho e Pinto.

segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

Avedon, que moda é essa? Ou a alvorada do merchandising

Por ROBERTO MUGGIATI

Cinquenta foi a década do bom gosto, da coisa cool e enxuta.

Um dos highlights desta trend foi o disco Jazz Red Hot and Cool, com o Dave Brubeck Quartet. Foi o mais ouvido pelo sophisticated people nas festas daquele fim de ano.

A capa mostrava a manequim-sensação da época, Suzy Parker, num deslumbrante vestido vermelho, entre Dave Brubeck ao piano e o saxofone alto Paul Desmond, aquele que queria soar como um very dry Martini – e soava.

As notas de capa do supercrítico George Avakiam admitiam candidamente que “a capa e o título deste LP fazem parte de uma promoção conjunta da Helena Rubinstein e da Columbia do novo baton da HR", do mesmo tom de vermelho do vestido da jovem.

Tudo isso prova que, se alguém aparece com uma ideia nova e brilhante, é inteiramente possível fazer negócios e ajudar um grupo de músicos de jazz ao mesmo tempo.


O autor da foto foi Richard Avedon (à direita), o fotógrafo de nove entre dez das estrelas da moda na época. Avedon se redimiu esteticamente, décadas depois, ao fazer uma série de retratos de um realismo dramático, em preto e branco sem nenhum retoque, inclusive seu próprio autorretrato.

E vamos ouvir uma faixa do disco, que resume tudo, Lover, de Richard Rodgers e Lorenz Hart.


https://www.youtube.com/watch?v=9jSrqA-JCAI

segunda-feira, 12 de setembro de 2016

Por Roberto Muggiati - CELEBRITY KILLERS - Soltaram o homem que tentou matar o Presidente Reagan. E os outros, onde estão?


Em 1981, Manchete publicou uma sequência de fotos de Sebastião Salgado (assinalado no círculo), o fotógrafo brasileiro que registrou o atentado contra Ronald Reagan,
Reprodução das fotos de Sebastião Salgado
publicadas na Manchete

Por ROBERTO MUGGIATI

Foi solto, aos 61 anos (na época era um jovem de 26), John Hinckley, Jr. – o homem que tentou assassinar o Presidente Ronald Reagan em março de 1981 nas calçadas de um hotel em Washington.

Vagamente inspirado em Taxi Driver, o rapaz (na foto à esquerda) queria chamar a atenção da ninfeta do filme, Jodie Foster. Ele cumpria pena num hospital psiquiátrico, mas um juiz federal determinou sua libertação por “não ser mais uma ameaça para si mesmo nem para os demais.”

É longa a lista dos celebrity killers nos Estados Unidos. Vamos lembrar alguns mais recentes.

Todo mundo sabe que fim levou Lee Harvey Oswald, o suposto atirador que matou John Kennedy em Dallas em 1963. Já Sirhan Bishara Sirhan, que assassinou Robert Kennedy na cozinha de um hotel em Los Angeles em 1968 foi condenado à morte na câmara de gás, mas a pena foi comutada em prisão perpétua , graças à decisão da justiça da Califórnia de anular todas as sentenças capitais proferidas antes de fevereiro de 1972, abolindo a pena de morte no estado. Nascido em Jerusalém, com nacionalidade jordaniana, Sirhan, hoje com 72 anos, disse que matou Kennedy em represália ao seu apoio a Israel na Guerra dos Seis Dias.

Também em 1968, o líder dos direitos humanos Martin Luther King Jr foi assassinado com um tiro de fuzil. O atirador, James Earl Ray, condenado a 99 anos, morreu na prisão de hepatite C em 1998, aos 70 anos.

Já em 1965, um líder mais radical dos direitos negros, Malcolm X foi assassinado numa rua de Nova York em frente de sua mulher grávida, Betty, e de suas quatro filhas, por três membros da Nação do Islão. Malcolm, que havia pertencido à organização, levou 16 tiros de balas de calibre 38 e 45, a maioria no coração. Tinha 39 anos.

Em 1968, a feminista radical Valerie Solanas deu três tiros (só acertou um) no artista plástico Andy Warhol, atingindo também o crítico Mario Amaya, que estava no ateliê do pintor, a conhecida The Factory. Valerie entregou-se à polícia, dizendo que Warhol “controlava demais minha vida.”

Diagnosticada com esquizofrenia paranoide, acabou sentenciada a três anos sob livramento condicional. Autora do “SCUM Manifesto” (SCUM seria a sigla para Society For Cutting Up Men; a palavra scum significa “escória”), Valerie Solanas morreu de pneumonia em 1988, aos 52 anos. Ela certamente viveu bem mais do que os seus “15 minutos de fama.” Warhol quase morreu: teve uma parada cardíaca na cirurgia, mas seu coração foi reanimado. Sofreu sequelas, tendo de usar um colete cirúrgico pelo resto da vida (morreria em 1987, aos 58). O atentado levou-o a esta reflexão: “O cinema faz as emoções parecerem tão fortes e reais, mas quando as coisas realmente acontecem com você é como assistir à televisão – você não sente nada. Justo no momento do tiro e a partir de então, eu sabia que estava vendo televisão. Os canais mudam, mas é tudo televisão.”


Matéria da Manchete sobre a morte de Sharon Stone  é até hoje reproduzida em sites internacionais como de uma "portuguese magazine".


Charles Manson, mentor intelectual dos sangrentos assassinatos da atriz Sharon Tate (mulher do cineasta Roman Polanski) e de quatro amigos dela que estavam na sua casa em Los Angeles – e, no dia seguinte, do casal La Bianca – continua na prisão, na Califórnia, aos 81 anos. Manson era o líder místico de uma comunidade de hippies, que chamava sua “Família” e mandou seus discípulos cometerem os crimes. Estes assassinatos, em agosto de 1969, visavam a provocar uma guerra entre negros e brancos. Manson batizou a operação de Helter Skelter, inspirado numa música muito doida do “Album Branco” dos Beatles. A carnificina encenada pela Família Manson – ao lado da tragédia patrocinada pelos Rolling Stones em Altamont – ajudou a sepultar o sonho de paz e amor da “Nação de Woodstock”, que chegara ao auge uma semana depois dos assassinatos, no megafestival de rock. (A autoria dos crimes só seria conhecida em novembro.) Um rapaz e duas moças da Família Manson que praticaram os assassinatos continuam presos; a terceira moça morreu de câncer na prisão em 2009.

Uma ex-integrante da Família Manson, Lynette “Squeacky” Fromme, tentou assassinar o presidente Gerald Ford em 1975, em Sacramento, Califórnia. Ela apontou para ele um revólver 45, mas um agente secreto agarrou a arma antes que Lynette apertasse o gatilho. Sentenciada à prisão perpétua, ela recebeu livramento condicional em 2009, aos 60 anos. (Curiosamente, Lynette, que fazia parte de um grupo de dança de Santa Monica, se apresentou aos onze anos na Casa Branca para o Presidente Eisenhower.)

A proteção de Gerald Ford foi reforçada, mas, apesar disso, dezessete dias depois o ele foi alvo de outro atentado. Quando Ford saía de um hotel no centro de San Francisco, Sara Jane Moore, no meio de uma multidão do outro lado da rua, apontou para o Presidente um revólver 38. Errou o único tiro porque a mira estava desajustada. O segundo tiro foi desviado por um segurança e a bala passou a apenas quinze centímetros da cabeça de Ford, ricocheteou e feriu levemente um chofer de táxi. Sara Jane foi sentenciada à prisão perpétua, mas saiu com liberdade condicional em 2007, aos 77 anos (ainda está viva, com 86). Sara Jane virou personagem do musical Assassins (1990), de Stephen Sondheim, ao lado de Lynette, John Hinckley e Lee Oswald.

Na noite de 8 de dezembro de 1980, quando voltava para seu apartamento  em Nova York, no edifício Dakota, John foi abordado por um rapaz que durante o dia tinha pedido a ele um autógrafo na capa do LP Double Fantasy. Mark David Chapman, fã dos Beatles obcecado por John, disparou cinco tiros de revólver 38, quatro dos quais acertaram em Lennon. Um carro de polícia chegou minutos depois e levou John para o hospital. O assassino ficou no local com um livro nas mãos, O Apanhador no Campo de Centeio, de J.D. Salinger. John perdeu cerca de 80% do seu sangue e morreu, aos quarenta anos de idade. Logo após da notícia, uma multidão se juntou em frente ao Dakota, com flores, velas e entoando canções de Lennon e dos Beatles. Hoje com 61 anos, Chapman teve vários pedidos de livramento recusados e cumpre pena na prisão de Attica, em Nova York. Curiosamente, Lennon celebrou uma rebelião de cunho político ocorrida na penitenciária em 1971 com a canção Attica State, do álbum Some Time in New York City, com uma letra premonitória: “What a waste of human power What a waste of human lives...”

Paro por aqui com estes celeb killers. Esqueci alguém? Me lembrem, por favor.