Reprodução Revista Contigo! |
Reprodução Revista Contigo! |
por José Esmeraldo Gonçalves (especial para a revista Contigo!) (*)
Ao lado das notas musicais, os números estão, por esses
dias, na partitura do maestro Eduardo Lages. Aos 68 anos, completados no dia 11
de março, ele comemora 50 anos de carreira, dos quais 38 comandando a orquestra
que acompanha Roberto Carlos, 74. A data é celebrada no palco - o cenário preferencial
e onipresente da longa trajetória do pianista, arranjador e compositor
niteroiense-, com o espetáculo “Eduardo Lages e Orquestra: o Maestro do Rei em
Toda Brasileira é uma Diva”. O musical estreou no Teatro Bradesco, em São Paulo, no dia 8 de março, Dia Internacional da Mulher, e seguirá, nos próximos meses, em turnê por
várias capitais.“Ando na rua e as pessoas me chamam de ‘maestro do rei’. Às
vezes, começam a conversar e perguntam qual é o meu nome mesmo (risos). Eu me acostumei e tenho o maior
orgulho disso. Até brinco que eu queria ser o rei dos maestros, não consegui
mas virei o maestro do rei”, diz, bem-humorado. Eduardo Lages recebeu a Contigo!em sua casa, na Zona Sul do Rio
de Janeiro. Uma escada em espiral leva ao terraço e a uma sala, na cobertura do
apartamento. Um mix de ambiente social e de criação. Em um canto da sala, um
piano. Ali certamente foram esboçados e começaram a nascer arranjos marcantes de
muitas canções de Roberto Carlos. Na parede, acima do piano, discos de ouro emoldurados
lembram o sucesso de alguns dos sete CDs, além de um DVD, da carreira solo do
maestro. Poderia haver mais troféus expostos – ele venceu vários festivais da
canção -, mas há um bom motivo para não congestionar as paredes. “Minha mulher (Mércia Lages, 68, com quem é casado há 42
anos) diz, com razão, que isso aqui é uma sala, não é uma gravadora”,
brinca.
Guardado em uma estante, destaca-se um bandolim que
pertenceu ao pai, um médico que gostava de realizar saraus musicais na casa da
família no Fonseca, bairro de Niterói (RJ). “Com outros médicos, ele formou um
conjunto chamado “Doutores da Ribalta”. O grupo fazia serestas às sextas-feiras
e convidava artistas conhecidos, como Sílvio Caldas, Ciro Monteiro e Luís Reis.
Garoto ainda, vi esse pessoal de perto. Até os 13 anos, eu estudava música
clássica, que foi a minha formação, mas aquelas reuniões me despertaram para a
música popular”, recorda, enquanto folheia uma pasta com recortes de jornais e
revistas que registram momentos da sua carreira e mostra programas de concertos
de música clássica no Teatro Municipal de Niterói. Em um deles, aos oito anos,
tocou Polichinelle, de Rachimaninoff. Naquela época, a quem perguntasse o que
queria ser quando crescesse, respondia no ato: “Quero ser maestro”. Conseguiu.
Mas o caminho até o sucesso teve escalas inusitadas.
Igreja & Cabaré
Aos 18 anos, quando se profissionalizou, Eduardo Lages tocava em uma igreja católica e, em seguida, ia para um cabaré. “Ali ganhei meu primeiro cachê. Não havia grandes casas de show e aqueles lugares tinham palcos grandes e recebiam políticos, empresários, autoridades. Ângela Maria, Caubi Peixoto e muitos músicos se apresentavam nos antigos cabarés”, conta. Assim, o futuro maestro passava da música sacra em órgão acústico para boleros profanos entoados ao piano do tipo “armário”. “Eu ia do céu ao inferno em poucos minutos. Quando contei isso no show, um cara levantou na plateia gritou ‘não necessariamente nessa ordem”, diverte-se. Às lembranças musicais da infância, Eduardo Lages soma um drama. Em 1961, ele era uma das crianças que estavam na plateia do GranCircus Norte-Americano, em Niterói. Três mil pessoas assistiam ao espetáculo quando começou um incêndio, de origem criminosa, atribuído a um ex-funcionário que havia sido demitido. A tragédia resultou em cerca de 400 mortos, dos quais 70% eram crianças. “Quando consegui sair do circo, em meio ao pânico, fui correndo até em casa, que ficava perto, avisar minha mãe. E voltei ao local. Lembro-me da cena dos animais fugindo. Eu tinha ido ao circo com um grupo de coleguinhas, oito deles morreram. Demorei a esquecer e, às vezes, ainda tenho uns sonhos estranhos”, conta.
Igreja & Cabaré
Aos 18 anos, quando se profissionalizou, Eduardo Lages tocava em uma igreja católica e, em seguida, ia para um cabaré. “Ali ganhei meu primeiro cachê. Não havia grandes casas de show e aqueles lugares tinham palcos grandes e recebiam políticos, empresários, autoridades. Ângela Maria, Caubi Peixoto e muitos músicos se apresentavam nos antigos cabarés”, conta. Assim, o futuro maestro passava da música sacra em órgão acústico para boleros profanos entoados ao piano do tipo “armário”. “Eu ia do céu ao inferno em poucos minutos. Quando contei isso no show, um cara levantou na plateia gritou ‘não necessariamente nessa ordem”, diverte-se. Às lembranças musicais da infância, Eduardo Lages soma um drama. Em 1961, ele era uma das crianças que estavam na plateia do GranCircus Norte-Americano, em Niterói. Três mil pessoas assistiam ao espetáculo quando começou um incêndio, de origem criminosa, atribuído a um ex-funcionário que havia sido demitido. A tragédia resultou em cerca de 400 mortos, dos quais 70% eram crianças. “Quando consegui sair do circo, em meio ao pânico, fui correndo até em casa, que ficava perto, avisar minha mãe. E voltei ao local. Lembro-me da cena dos animais fugindo. Eu tinha ido ao circo com um grupo de coleguinhas, oito deles morreram. Demorei a esquecer e, às vezes, ainda tenho uns sonhos estranhos”, conta.
A inspiração dos saraus domésticos, a experiência como
pianista de cabaré e a vida nada fácil de músico clássico, iniciante, levaram
Eduardo Lages a explorar as possibilidades da música popular. A família, mais
cautelosa, preferia que ele tentasse uma carreira mais estável. Fez vestibular
para Engenharia, passou, matriculou-se, mas havia o MAU no meio do caminho, na
virada dos anos 1960/1970. Era o Movimento Artístico Universitário que reunia
jovens sonhadores como Ivan Lins, Aldir Blanc, César Costa Filho, Gonzaguinha,
entre outros.
No tempo dos festivais
Os festivais de música simbolizavam uma porta da esperança para muitos compositores. Eduardo recorda que participou de umas dez competições. “Em Niterói havia um Festival da Canção Popular. Foram realizados quatro, ganhei três. Naquela época, atraiam gente como Sérgio Ricardo, Sergio Bittencourt e vários músicos e compositores que depois se tornaram famosos. O festival mais importante que eu ganhei foi o Internacional da Canção do México, em 1970, com a música “Razão de paz para não cantar”, composta com Alézio de Barros, interpretada pela cantora Cláudia Oliveira, 66, rival da Elis Regina, na época”, conta, acrescentando que a mesma música ficou em quarto lugar no 4° Festival Internacional da Canção do Rio de Janeiro. “Chegou um momento” – conta Eduardo – “que todo o grupo oriundo do MAU foi contratado pela TV Globo para fazer um programa chamado Som Livre Exportação”. O musical, apresentado por Ivan Lins e Elis Regina, durou pouco - ficou no ar de dezembro de 1970 a agosto de 1971 – mas abriu para Eduardo Lages as portas da TV Globo, que o contratou como arranjador. “Trabalhei em um programa de humor, ao lado da Sandra Bréa e da Christina Nunes, chamava-se “Uau”, passei pelo programa do Moacyr Franco e pelo Fantástico”. Gostava de fazer aberturas de programas. Fiz um arranjo para a famosa introdução instrumental do Jornal Nacional, a música The Fuzz, de Frank de Vol,e fui o primeiro maestro do “Globo de Ouro”, completa. Foi neste programa que Eduardo Lages se aproximou de Roberto Carlos, que toda semana estava lá com alguma música na parada de sucesso. “Há pouco tempo, me lembrei de um fato interessante. Por volta de 1974, eu trabalhava com Benito di Paula, cujo empresário, Marcos Lázaro, era o mesmo do Roberto. Um dia, o pianista do RC7 teve um problema de saúde e o Marcos Lázaro me pediu para substituí-lo durante uma turnê no interior de São Paulo. Engraçado é que ensaiei com a banda, sem o Roberto, só o vi no palco e não tive chance de maior contato. Trabalhei também no Chiko’s Bar, era um point do Rio de Janeiro, todo artista estrangeiro que vinha ao Rio passava lá.
Regendo a orquestra de Sinatra
Foi onde conheci Frank Sinatra, Michel Legrand, Liza Minelli e onde toquei piano a quatro mãos com Burt Bacharach. Roberto frequentava o Chiko’s, mas só fui conhecê-lo melhor mesmo no Globo de Ouro”, recorda o maestro. “Foi através do Luís Carlos Miéle e do Ronaldo Bôscoli, que eram diretores do programa de Natal do Roberto. Fiz 37 desses especiais anuais. Os primeiros ainda como funcionário da Globo”, acrescenta.
No tempo dos festivais
Os festivais de música simbolizavam uma porta da esperança para muitos compositores. Eduardo recorda que participou de umas dez competições. “Em Niterói havia um Festival da Canção Popular. Foram realizados quatro, ganhei três. Naquela época, atraiam gente como Sérgio Ricardo, Sergio Bittencourt e vários músicos e compositores que depois se tornaram famosos. O festival mais importante que eu ganhei foi o Internacional da Canção do México, em 1970, com a música “Razão de paz para não cantar”, composta com Alézio de Barros, interpretada pela cantora Cláudia Oliveira, 66, rival da Elis Regina, na época”, conta, acrescentando que a mesma música ficou em quarto lugar no 4° Festival Internacional da Canção do Rio de Janeiro. “Chegou um momento” – conta Eduardo – “que todo o grupo oriundo do MAU foi contratado pela TV Globo para fazer um programa chamado Som Livre Exportação”. O musical, apresentado por Ivan Lins e Elis Regina, durou pouco - ficou no ar de dezembro de 1970 a agosto de 1971 – mas abriu para Eduardo Lages as portas da TV Globo, que o contratou como arranjador. “Trabalhei em um programa de humor, ao lado da Sandra Bréa e da Christina Nunes, chamava-se “Uau”, passei pelo programa do Moacyr Franco e pelo Fantástico”. Gostava de fazer aberturas de programas. Fiz um arranjo para a famosa introdução instrumental do Jornal Nacional, a música The Fuzz, de Frank de Vol,e fui o primeiro maestro do “Globo de Ouro”, completa. Foi neste programa que Eduardo Lages se aproximou de Roberto Carlos, que toda semana estava lá com alguma música na parada de sucesso. “Há pouco tempo, me lembrei de um fato interessante. Por volta de 1974, eu trabalhava com Benito di Paula, cujo empresário, Marcos Lázaro, era o mesmo do Roberto. Um dia, o pianista do RC7 teve um problema de saúde e o Marcos Lázaro me pediu para substituí-lo durante uma turnê no interior de São Paulo. Engraçado é que ensaiei com a banda, sem o Roberto, só o vi no palco e não tive chance de maior contato. Trabalhei também no Chiko’s Bar, era um point do Rio de Janeiro, todo artista estrangeiro que vinha ao Rio passava lá.
Regendo a orquestra de Sinatra
Foi onde conheci Frank Sinatra, Michel Legrand, Liza Minelli e onde toquei piano a quatro mãos com Burt Bacharach. Roberto frequentava o Chiko’s, mas só fui conhecê-lo melhor mesmo no Globo de Ouro”, recorda o maestro. “Foi através do Luís Carlos Miéle e do Ronaldo Bôscoli, que eram diretores do programa de Natal do Roberto. Fiz 37 desses especiais anuais. Os primeiros ainda como funcionário da Globo”, acrescenta.
Ao ganhar a confiança do cantor, Eduardo Lages foi integrado
à orquestra. “Era uma época em que ele viajava muito. Eu tinha que me ausentar
da Globo, às vezes eram temporadas de 15 dias na Europa. Eu pedia para o
Roberto ligar para o Boni (José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, então
superintendente da TV Globo) para quebrar meu galho. Até que não deu mais. E o
trabalho com o Roberto passou a ser minha prioridade”, revela, destacando que
uma motivação a mais para trabalhar com o cantor foi a oportunidade de reger uma
orquestra. “Sempre fui fascinado por orquestra. Foi um dos motivos que me fizeram
aceitar o convite”, conta ele, que entrou então no ritmo de turnês e shows de
um ídolo popular. Hoje, segundo o maestro, Roberto Carlos tem naturalmente um
ritmo mais tranquilo e programado de trabalho. “Mas há quase 40 anos, o público
era de agarrar e rasgar a roupa até mesmo dos integrantes da banda. Éramos
jovens. Para nós, era uma festa. Pegava-se mulher (risos). Às vezes, passávamos
três meses fora. Ficávamos todos juntos no mesmo hotel. Hoje, é diferente, cada
um viaja no seu horário, Roberto tem o jatinho dele. Os shows são grandiosos,
em locais melhores. Era uma outra época”, conta.
O dia em que o show parou
As lembranças certamente dariam um livro, como a autobiografia que Roberto Carlos está elaborando, segundo ele mesmo revelou no ano passado. “Ele está escrevendo um livro? “Eu também já falei que eu vou escrever um livro. Está na cabeça. Às vezes, quando Roberto me pergunta se já fiz um determinado arranjo, respondo, brincando, que não mas as notas musicais estão na minha cabeça, é só balançar que caem. Assim é o meu livro”, diz, rindo. Uma história que estará na provável biografia do maestro, caso a sua cabeça um dia dê uma sacudida nas letras, aconteceu no México. “Eu caí na plateia”, adianta Eduardo. “O show estava correndo e o empresário tentava avisar ao Roberto que uma autoridade havia chegado. Um prefeito, algo assim. Eu estava de costas para a público e fui recuando para ficar no campo de visão dele e fazer um sinal. Andei de costas até cair na plateia. Lembro da sensação terrível de pisar no vazio. O show parou, mas saí aplaudido”, diverte-se ele, que recorda também um dos momentos mais marcantes da trajetória ao lado de Roberto Carlos. “Quando Frank Sinatra veio ao Brasil, em 1980, fui a um ensaio dele, com orquestra completa, em um hotel, no Rio. Fiquei deslumbrado. Só pensava em ter um dia uma orquestra daquela para trabalhar. Um mês depois, fui fazer um show com Roberto em Nova York. Naquela época, a gente não viajava com toda a nossa orquestra, que era completada com músicos locais. Eu fui antes, com esse objetivo. Lá procurei um contractor, que agencia instrumentistas. Era um baixinho, com cara de mafioso, fumando charuto, e eu com meu inglês ruim para caramba, falei: ‘Olha, eu quero quatro trompetes, trombones, saxofone, harpa, um oboé, doze violinos, quatro violas...”. Ao saber que eu era brasileiro, ele disse que adorava o Rio e que estivera na cidade um mês antes. Perguntei o que tinha ido fazer no Rio. “Fui como Frank”. “Que Frank?”, eu quis saber. “O Sinatra”, disse o baixinho. E mandou essa: “Esses músicos que você está contratando são os músicos do Sinatra. Ou seja, em poucos dias, realizei um sonho como eu jamais imaginaria. Foi uma das coisas mais bonitas que já aconteceram comigo. Tudo isso, o Roberto me proporcionou.Tenho consciência de que estou fazendo o meu show por causa dele. Claro, o tenho o meu valor, minha carreira solo. Mas as pessoas procuram o maestro do rei, tenho consciência disso e não me incomodo, tenho orgulho. A gente briga, mas atrito só de trabalho, tem coisa que ele gosta que eu não gosto, mas eu respeito. No final faço o que ele gosta, quem manda é ele”, brinca, admitindo que, no começo, o diálogo com Roberto era mais difícil. Hoje, como se diz de jogadores de futebol super entrosados, eles se entendem, literalmente, “por música”. “Atualmente, eu o conheço bem, é mais fácil. Roberto é um arranjador nato. Ele é um cantor, não precisa ser um exímio instrumentista, é muito intuitivo, muito musical. Às vezes, me mostra um som, cantarolando, que eu já sei o que ele quer. Em geral, a gente faz o arranjo junto, eu vou escrevendo até chegar a um ponto em que tem que botar os violinos, a orquestra em si, aí eu vou para casa, escrevo, mas a gente muda muita coisa durante a gravação. No princípio era mais complicado, eu fazia quatro cinco arranjos e, muitas vezes, acabava valendo o primeiro. Nós já chegamos a levar dois meses numa música só. É preciso muito cuidado com as músicas do Roberto, vou dizer porque: ele gravou umas mil músicas e tem, digamos, 200 sucessos na boca do povo. Então, se ele vai cantar “Detalhes”, eu não posso deixar de pôr isso (Eduardo Lages levanta-se e vai tocar ao piano as notas de abertura da famosa canção). Roberto trabalhou com grandes arranjadores que criaram acordes que passaram a fazer parte da música. Aquilo traz muita emoção e eu não mexo nessa essência que está enraizada no coração das pessoas”, explica.
O dia em que o show parou
As lembranças certamente dariam um livro, como a autobiografia que Roberto Carlos está elaborando, segundo ele mesmo revelou no ano passado. “Ele está escrevendo um livro? “Eu também já falei que eu vou escrever um livro. Está na cabeça. Às vezes, quando Roberto me pergunta se já fiz um determinado arranjo, respondo, brincando, que não mas as notas musicais estão na minha cabeça, é só balançar que caem. Assim é o meu livro”, diz, rindo. Uma história que estará na provável biografia do maestro, caso a sua cabeça um dia dê uma sacudida nas letras, aconteceu no México. “Eu caí na plateia”, adianta Eduardo. “O show estava correndo e o empresário tentava avisar ao Roberto que uma autoridade havia chegado. Um prefeito, algo assim. Eu estava de costas para a público e fui recuando para ficar no campo de visão dele e fazer um sinal. Andei de costas até cair na plateia. Lembro da sensação terrível de pisar no vazio. O show parou, mas saí aplaudido”, diverte-se ele, que recorda também um dos momentos mais marcantes da trajetória ao lado de Roberto Carlos. “Quando Frank Sinatra veio ao Brasil, em 1980, fui a um ensaio dele, com orquestra completa, em um hotel, no Rio. Fiquei deslumbrado. Só pensava em ter um dia uma orquestra daquela para trabalhar. Um mês depois, fui fazer um show com Roberto em Nova York. Naquela época, a gente não viajava com toda a nossa orquestra, que era completada com músicos locais. Eu fui antes, com esse objetivo. Lá procurei um contractor, que agencia instrumentistas. Era um baixinho, com cara de mafioso, fumando charuto, e eu com meu inglês ruim para caramba, falei: ‘Olha, eu quero quatro trompetes, trombones, saxofone, harpa, um oboé, doze violinos, quatro violas...”. Ao saber que eu era brasileiro, ele disse que adorava o Rio e que estivera na cidade um mês antes. Perguntei o que tinha ido fazer no Rio. “Fui como Frank”. “Que Frank?”, eu quis saber. “O Sinatra”, disse o baixinho. E mandou essa: “Esses músicos que você está contratando são os músicos do Sinatra. Ou seja, em poucos dias, realizei um sonho como eu jamais imaginaria. Foi uma das coisas mais bonitas que já aconteceram comigo. Tudo isso, o Roberto me proporcionou.Tenho consciência de que estou fazendo o meu show por causa dele. Claro, o tenho o meu valor, minha carreira solo. Mas as pessoas procuram o maestro do rei, tenho consciência disso e não me incomodo, tenho orgulho. A gente briga, mas atrito só de trabalho, tem coisa que ele gosta que eu não gosto, mas eu respeito. No final faço o que ele gosta, quem manda é ele”, brinca, admitindo que, no começo, o diálogo com Roberto era mais difícil. Hoje, como se diz de jogadores de futebol super entrosados, eles se entendem, literalmente, “por música”. “Atualmente, eu o conheço bem, é mais fácil. Roberto é um arranjador nato. Ele é um cantor, não precisa ser um exímio instrumentista, é muito intuitivo, muito musical. Às vezes, me mostra um som, cantarolando, que eu já sei o que ele quer. Em geral, a gente faz o arranjo junto, eu vou escrevendo até chegar a um ponto em que tem que botar os violinos, a orquestra em si, aí eu vou para casa, escrevo, mas a gente muda muita coisa durante a gravação. No princípio era mais complicado, eu fazia quatro cinco arranjos e, muitas vezes, acabava valendo o primeiro. Nós já chegamos a levar dois meses numa música só. É preciso muito cuidado com as músicas do Roberto, vou dizer porque: ele gravou umas mil músicas e tem, digamos, 200 sucessos na boca do povo. Então, se ele vai cantar “Detalhes”, eu não posso deixar de pôr isso (Eduardo Lages levanta-se e vai tocar ao piano as notas de abertura da famosa canção). Roberto trabalhou com grandes arranjadores que criaram acordes que passaram a fazer parte da música. Aquilo traz muita emoção e eu não mexo nessa essência que está enraizada no coração das pessoas”, explica.
O maestro, que tem 19 músicas gravadas por Roberto embora
não se dedique à composição (“Faço uma música por ano. Eu começo a compor e
acabo criando um arranjo, que também é uma composição”, diz), compartilha com o
amigo um gosto musical mais romântico. “Sempre fui mais influenciado por maestros
e arranjadores. Gosto muito do Michel Legrand, do Nelson Riddle, Don Costa, do
maestro Chiquinho de Morais, que trabalhou com o Roberto. Gosto muito de
Chopin. Chopin é o Roberto Carlos da música clássica. Não estou comparando, mas
Chopin, como Roberto, tinha comunicação fácil com as pessoas”, justifica ele. A
rotina de trabalho com Roberto é hoje bem mais previsível e calma. “Não somos
de nos visitar, a gente encontra muito no estúdio dele, quando vai gravar disco.
Na época do especial de fim de ano, trabalhamos por dois meses, além de shows,
viagens. O maior contato é assim. Socialmente, não, ele não sai, eu não saio.
Quando a gente está junto, é muita brincadeira. Roberto tem bom humor. Ele se
sente muito bem com a banda. São pessoas que já estão com ele há muito anos”.
O ritmo mais calmo de trabalho a que Eduardo Lages se
refere, também se reflete na sua vida pessoal. Pai de Camille, 41, Maria
Eduarda, 38 e Christine, 35, as três, jornalistas, ele tem quatro netos: Nathalie,
18 e Enrico, 10, filhos de Camille; e Ana Luíza 14, e Maria Fernanda, 9, de
Maria Eduarda. “Gosto de juntar todo mundo. Sou avô mais presente do que fui
com as minhas filhas, na época em que eu mais viajava”, diz ele, que costuma
pegar a neta mais nova na escola. Essa rotina, com direito a caminhadas na
Lagoa Rodrigo de Freitas, só é interrompida pela turnê do show de comemoração
dos 50 anos de carreira.
Espetáculo no Vivo Rio, dia 24 de abril
No dia 24 de abril, no Vivo Rio, será a vez do Rio aplaudir o espetáculo, apresentado pela Bombril,e que irá a Curitiba, no dia 22 de maio e Belo Horizonte, no dia 4 de julho, além de outras capitais em datas a serem ainda fechadas. “A comemoração veio quase sem querer. A ideia era ir além de um show com orquestra grande e mostrar um musical com falas, dramaturgia e performances. Eu me toquei depois que estou fazendo 50 anos de carreira. E um espetáculo alegre. Para você ter uma ideia, tem um momento em que a orquestra faz até uma “ola”. Além de 25 músicos no palco, temos as Cluster Sisters na parte teatralizada e de canto, músicas como ‘É o amor”, “Maria, Maria”, “Michelle”, “Eleanor Rigby”, “Como é grande o meu amor por você”, “Emoções”, entre outras. A direção é de Ulisses Cruz e o roteiro de Vinicius Faustini. Claro que eu boto meus “cacos”.O show simula um programa de rádio onde sou o apresentador. Interajo com Ivete Sangalo em um telão. Ela faz uma participação gravada como uma ouvinte que entra em um concurso de adivinhação de músicas na rádio”, conclui Eduardo Lages, que vai transformar o show em um DVD.
Espetáculo no Vivo Rio, dia 24 de abril
No dia 24 de abril, no Vivo Rio, será a vez do Rio aplaudir o espetáculo, apresentado pela Bombril,e que irá a Curitiba, no dia 22 de maio e Belo Horizonte, no dia 4 de julho, além de outras capitais em datas a serem ainda fechadas. “A comemoração veio quase sem querer. A ideia era ir além de um show com orquestra grande e mostrar um musical com falas, dramaturgia e performances. Eu me toquei depois que estou fazendo 50 anos de carreira. E um espetáculo alegre. Para você ter uma ideia, tem um momento em que a orquestra faz até uma “ola”. Além de 25 músicos no palco, temos as Cluster Sisters na parte teatralizada e de canto, músicas como ‘É o amor”, “Maria, Maria”, “Michelle”, “Eleanor Rigby”, “Como é grande o meu amor por você”, “Emoções”, entre outras. A direção é de Ulisses Cruz e o roteiro de Vinicius Faustini. Claro que eu boto meus “cacos”.O show simula um programa de rádio onde sou o apresentador. Interajo com Ivete Sangalo em um telão. Ela faz uma participação gravada como uma ouvinte que entra em um concurso de adivinhação de músicas na rádio”, conclui Eduardo Lages, que vai transformar o show em um DVD.
Apesar das muitas afinidades com o rei, Eduardo Lages não
é supersticioso. E veste marrom. Essa entrevista foi feita em uma sexta-feira, 13,
pouco depois das 13 horas. “Outro dia, eu vestia uma roupa marrom e o Roberto
olhou e só perguntou: “Está de chocolate hoje”?
(*) Com extras para o blog