por Roberto Muggiati
Caiu-me nas mãos por estes dias um filme espetaculoso de Emilio Estevez, Bobby (2006). A propaganda anuncia: “Vinte e dois destinos, um momento da História que ninguém vai esquecer.” O enredo se passa no Ambassador Hotel de Los Angeles, em 4 de junho de 1968, uma terça-feira, no dia em que Robert Francis Kennedy venceu as eleições primárias da Califórnia para concorrer à presidência dos Estados Unidos pelo Partido Democrata.
Pouco depois da meia-noite, contrariando sua segurança, o irmão de John Kennedy atravessa a cozinha para chegar mais rapidamente à sala de imprensa do hotel, onde dará uma entrevista coletiva. E, justamente na cozinha cheia e enfumaçada, Bobby é atingido com três tiros de um revólver calibre 22 por um ativista palestino de 24 anos, Sirhan Bishara Sirhan, que feriu ainda cinco pessoas.
Cinquenta anos passaram correndo. Dois meses antes do atentado contra RFK, o paladino dos direitos civis, Martin Luther King, foi assassinado a tiros em Memphis. Um dia antes, a radical feminista Valerie Solanas deu três tiros em Andy Warhol, considerado macho chauvinista.
Entre os atores estelares de Bobby estão Anthony Hopkins, Harry Belafonte, Martin Sheen, William Macy (o marido trapalhão de Fargo que manda sequestrar a própria mulher), Sharon Stone, Lindsay Lohan, Demi Moore, Helen Hunt. Robert Kennedy aparece em flashes de TV e todo o elenco parece aguardá-lo como uma espécie de Godot...
Os defensores dos valores democráticos nos EUA viam uma nova esperança na figura do irmão de John Kennedy: Bobby tinha tudo para ser eleito em 1968, não fosse assassinado. A vaga presidencial sobrou para o republicano Richard Milhous Nixon, uma das figuras mais tenebrosas da política americana, forçado a renunciar em 1974 por causa do Escândalo Watergate.
Bill Eppridge, fotógrafo da revista Life, abandonou um ensaio sobre cavalos selvagens em Montana e se mandou entusiasmado para LA no seu Jeep quando soube que Kennedy seria candidato à Presidência dos EUA. Estava no lugar certo na hora certa para fazer uma das fotos mais expressivas do século 20, uma foto em preto&branco com dramático efeito de chiaroscuro e composição clássica em estilo de Pietà, com o taifeiro mexicano Juan Romero confortando Bobby, que ainda trocou algumas palavras com ele:
RFK: Está todo mundo OK?
Romero: Sim, todo mundo está OK.
RFK: Tudo vai ficar OK.
Socorristas médicos chegaram em poucos minutos e colocaram o senador numa maca, o que o levou a sussurrar.
RFK: Não me levantem.
Foram suas últimas palavras, ele perdeu a consciência logo a seguir. Hospitalizado no Bom Samaritano de Los Angeles, RFK morreu nas primeiras horas do dia 6 de junho.
A revista Time, que saudara a candidatura de Kennedy em 24 de maio com uma ilustração do artista pop Roy Liechtenstein, encomendou outra capa para o artista, a de um revólver fumegando apontado para o leitor, publicada em 21 de junho, uma matéria de reflexão intitulada The Gun in America.
Sirhan Bishara Shirhan, aos 74 anos, continua cumprindo a pena de prisão perpétua na penitenciária de San Diego. Como motivação do atentado, ele alegou o apoio do senador a Israel.
Alguns observadores políticos consideram o assassinato de RFK como o primeiro episódio de violência politica nos EUA decorrente do conflito Israel-Palestina no Oriente Médio.
Cinquenta anos depois, nada mudou. Ao contrário, nunca se venderam tantas armas, com tanta facilidade, nos Estados Unidos – e elas têm sido usadas com frequência cada vez maior, chegando até a banalizar a mortandade em massa.
E as divergências entre israelenses e palestinos estão cada vez mais acirradas, cada vez mais longe de um final pacífico.