Estou há uma semana tentado descobrir quem é aquela mulher que a Veja apontou como símbolo da mulher brasileira, exemplo perfeito de bela, recatada e do lar.
Esqueçam Pagu, Leila Diniz, Olga Benário, Anita Garibaldi, Iara Iavelberg, Maria da Penha, Maria Quitéria, Zilda Ars, Bertha Lutz, Nise da Silveira e tantas outras indisciplinadas e despudoradas que tentaram ir além do cafofo. Elas perderam suas batalhas.
De onde a Veja teria tirado esse novo padrão da mulher pós-golpe?
Rodando em sebos de revistas no Centro do Rio encontrei a prova que faltava e o livreiro nem precisou fazer delação premiada. A matéria da Veja é inspirada em uma edição da revista Scenna Muda, de 1922. As brasileiras "bellas", recatadas e do lar estão lá fotografadas e descritas. Até os anúncios da revista são dirigidos às mulheres perfeitas do começo do século passado.
Essa mesma imaculada que a Veja - com um texto caipirinha - se orgulha de resgatar agora como espelho para suas leitoras.
As revistas atuais têm especialistas que fazem permanentes pesquisas sobre audiência para conhecer seus leitores. Não se enganem: se a Veja vendeu tanto a imagem da mulher ideal, a nova mulher brasileira pós-golpe, é porque suas leitoras assim se identificam e é o que esperam e o que vão imitar. A isso se dá o nome de formação de opinião. Coisa fina. Não desdenhe do perfil das vencedoras.
Como contribuição desinteressada, retiro da Scenna Muda algumas fotos das perfeitinhas de 1922. Figurinos, penteados, produtos que consumia, está tudo aí.
O pessoal vitorioso já pode tirar a camisa amarela: o figurino da Scenna Muda é a moda.
Sugestão para adereço ideal para cerimônias de posse. |
A mulher pós-golpe não dá mole em rede social, usa diário e desabafa, quando o faz, em forma de sonetos. É o máximo que se permite de rebeldia chique. Ela e o marido adoram se comunicar por cartas. |
Nada de decotes. Só um par de joelhos e nada de mostrar as coxinhas. |
A mulher pós-golpe tem "criadas" e se orgulha disso. |
O maridão precisa relaxar. A mulher pós-golpe entende isso, ela o distrai com seus dotes musicais e o incentiva a "libertar o galináceo" (era a expressão da época para "soltar a franga"). |
Mesmo quando leva um puxão de orelhas, ela sorri. É de brincadeirinha. A harmonia conjugal permite tais folguedos. |
A mulher pós-golpe usa pó-de-arroz em doses hospitalares: parecer sempre mais branca é essencial |