Guilherme Guimaráes em foto de Hélio Santos para a Manchete |
Por ROBERTO MUGGIATI
Minha primeira mulher era feminista.
Tinha sido também a grande anfitriã do soçaite-esquerda-festiva carioca antes do golpe militar. Quando a conheci, em Paris, era casada com um judeu doleiro podre de rico, era amante de um arquiteto francês que dirigia uma Porsche pelos Champs Elysées – e não é que escolheu a mim para juntar os trapos?
De volta ao Rio, depois de uma temporada de três anos na BBC de Londres, o destino não podia me reservar outra coisa: um emprego de repórter na revista Manchete. No Carnaval de 1966, fui escalado para cobrir o Baile das Bonecas, no Automóvel Clube, no Passeio Público. Nosso traje obrigatório era o smoking, lembro os primos Ricardo Gontijo e Lucas Mendes em suas roupas de pinguim no apartamento que dividiam no Bar Vinte.
Anúncio dos bailes do Automóvel Club, no Rio de Janeiro, em1966. Reprodução |
Como boa feminista, ela não admitia ficar de fora da festa. A mulher devia acompanhar o homem em tudo. Tinha porque tinha de me acompanhar ao Baile das Bonecas. Mas como se emperiquitar? Meu salário não dava para nada. Ela lembrou que, nos tempos de dondoca, se vestia chez Guilherme Guimarães (*), era até amiga do estilista, que morava com os avós. Lá fomos nós – Guilherme tinha então 26 anos.
Magnânimo, em retribuição aos guarda-roupas que minha primeira mulher havia comprado dele, Gui Gui escolheu uma peça de tecido tailandês, ou indonésio, sei lá, e com dois ou três toques sutis envolveu Fulana naquele pano da maneira mais elegante que só um gênio da moda seria capaz de criar.
Sonia Dutra na capa da Manchete, Carnaval 1966. |
Do meu texto só deve ter sido publicada a palavra Blecaute, que talvez eu tenha escrito errado, Blackout. O resto é história, está lá nas páginas mofadas da revista que chegou a ser, em certa época, o registro mais fiel da alma brasileira.
(*) Guilherme Guimarães, um dos grandes nome da moda brasileira, morreu ontem, no Rio, aos 76 anos.