Ontem, comentei o lançamento do livro Fala, crioulo, de Haroldo Costa, com depoimentos de negros e da sua luta para afirmação acima e além dos preconceitos. Ao longo da história, essa luta se faz passo a passo. Por coincidência, a matéria de capa da Revista O Globo (na reprodução)registra, hoje, um desses avanços. Há dois ou três anos, os principais jornais do país publicaram editoriais irados (é só conferir as coleções) sobre a democratização de acesso ao Instituto Rio Branco. Criticavam fortemente as mudanças, demonstravam preferir o Itamaraty como eterno reduto de ricos e bem nascidos, da elite e até de dinastias de diplomatas mais deslumbrados com os salões das "metrópoles" do que com as posições brasileiras. O Itamaraty era uma espécie de Ilha de Caras. Muito punho de renda, muita subserviência e pouca afirmação do país lá fora. Com o acesso mais democrático, a diplomacia ganha novo perfil e competência: há engenheiros, administradores, bacharéis em direito e relações internacionais, advogados, professores. São pequenas e fundamentais mudanças que renovam a esperança. Setenta por cento dos candidatos são homens, trinta por cento mulheres. E a Revista do Globo destaca a posse de Amintas Silva, nascido em um bairro de classe média baixa de Salvador. Um negro. Fala alto, crioulo.
Jornalismo, mídia social, TV, streaming, opinião, humor, variedades, publicidade, fotografia, cultura e memórias da imprensa. ANO XVI. E, desde junho de 2009, um espaço coletivo para opiniões diversas e expansão on line do livro "Aconteceu na Manchete, as histórias que ninguém contou", com casos e fotos dos bastidores das redações. Opiniões veiculadas e assinadas são de responsabilidade dos seus autores. Este blog não veicula material jornalístico gerado por inteligência artificial.
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domingo, 30 de agosto de 2009
sábado, 29 de agosto de 2009
Fala, crioulo 1
Quase três décadas depois da primeira versão, está nas livrarias, revista e ampliada, a segunda edição do livro Fala, crioulo (Record), organizado pelo historiador e jornalista Haroldo Costa. São 33 entrevistados. "Foram escolhidas pessoas de vários setores profissionais e nível educacional. A tentativa é mostrar um painel plural e diversificado", diz o jornalista. Um livro oportuno. Ultimamente, articulistas brancos de importantes jornais pregam que no Brasil não há racismo. Reeditam a velha e furada teoria do "país cordial", da "democracia racial". Bom que leiam o Fala, crioulo, e, de quebra, visitem o site de Haroldo Costa (no link)
Fala, crioulo 2
O jogo Brasil X Inglaterra na Copa de 70 foi um dos mais decisivos para a nossa seleção. Foi um jogo especialmente violento, o Brasil ganhou de 1 a 0, Jairzinho fez um gol apenas aos 13 minutos do segundo tempo, e um dos destaques em campo foi o craque Paulo César Lima, o Caju, que naquele jogo substituiu Gerson. Paulo Cesar, que saiu do Brasil vaiado no Morumbi (a torcida paulista achava que sua convocação poderia ameaçar Rivelino), foi escalado na seleção dos melhores do mundial por Helênio Herrera, ao fim da Copa. Pois é, é do PC Caju um dos depoimentos mais expressivos do livro Fala, crioulo, de Haroldo Costa (Record). "A verdade é que muita gente não aguentava, não aceitava, não engolia que eu frequentasse festas de colunáveis, que eu fosse ao teatro em noite de gala, a bons restaurantes, a boates da moda" (...) "Eu era titular absoluto, estava numa fase esplêndida, maravilhosa, física e tecnicamente, mas como não ficava calado com as coisas que ouvia e sentia na antiga CBD, foram me esvaziando até o final, quer dizer, até me cortarem inteiramente", conta Paulo César, que chama a atenção para um detalhe: nunca fez publicidade no Brasil. Na temporada europeia, revela no livro, quando foi jogar na França assinou contratos com a Puma, com a Perrier e até com o costureiro francês Michel Axel. Aqui, jogando pelo Botafogo e Flamengo, no auge da popularidade como campeão do mundo, não foi chamado pelas agências de publicidade, ao contrário dos "brancos" do time. A propósito, a exceção, nos comerciais da época, por ser Pelé, era Pelé. Na reprodução da Manchete, julho de 1970, Paulo César em ação no México contra a violenta defesa inglesa.
Fala, crioulo 3
Entre os depoimentos reunidos no livro Fala, Crioulo, de Haroldo Costa, (Record), estão as revelações de Vera Lúcia Couto dos Santos. Para os mais novos, um breve perfil. Vera emplogou o Rio, em 1964, quando foi eleita Miss Renascença e, depois, Miss Guanabara. Quer dizer: empolgou a maioria mas irritou a ala racista. Eleita Miss Guanabara no ano do Quarto Centenário da cidade? A primeira negra a conseguir tal título? Era demais, o society entrou em crise. No depoimento a Haroldo Costa, Vera conta que preconceito não era novidade para ela. Ainda aluna da escola Sagrado Coração de Maria, no Méier, ficava sempre isolada no recreio. Era uma das alunas com o uniforme mais bem cuidado e isso a tornava alvo de agressões verbais: "Essa crioula metida a branca compra tudo do bom e do melhor", diziam. Às vésperas de concorrer ao Miss Brasil como representante carioca, recebeu telefonemas anônimos que tentavam convencê-la a desistir "porque um grupo de senhoras da sociedade comprou mesas especialmente para vaiar". Na noite do desfile, quando fez sua primeira passagem na passarela, ouviu uma dessas senhoras gritar: "Sai daí, crioula! Teu lugar é na cozinha! Não se manca não?" Vera foi eleita Miss Brasil 2, perdeu para Miss Paraná. A Fatos e Fotos cobriu o concurso, em julho de 1964, e registrou que Vera Lúcia Couto dos Santos ganhou o segundo lugar, "mas sob polêmica". No livro Fala, Crioulo, Vera diz que considerou aquele segundo lugar uma vitória. E foi, pelas circunstâncias adversas. Na reprodução da F&F, a beleza negra da carioca.
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