Cynthia Lennon com o carrinho de bebê que virou personagem deste post. Reprodução Pinterest |
Por Roberto Muggiati
No final de 1963, John Lennon
instalou-se em Londres com a mulher Cynthia e o filho de oito meses Julian em
Emperors Gate, no bairro de South Kensington. Apesar de toda a pompa e
circunstância do nome da rua, o apartamento dava para o Terminal Aéreo do Oeste
de Londres e ficava perto de um trecho a céu aberto do metrô, com trens
barulhentos passando a cada minuto. Meses antes, eu tinha morado perto dali, em
Collingham Gardens, felizmente uma zona mais recôndita no verde dos jardins do
mesmo nome.
Àquela altura, embora trabalhasse
no grande império radiofônico da British Broadcasting Corporation (BBC), eu
estava confinado ao gueto do Serviço Brasileiro e só ouvira vagamente falar dos
Beatles. Minha paixão era o jazz e quase toda noite eu ia ao Ronnie Scott’s
ouvir os bons músicos locais, como o tenorista Tubby Hayes, e também
saxofonistas americanos como Johnny Griffin e Dexter Gordon, este iniciando um
período de exílio na Europa.
Cynthia e Lennon se conheceram na escola de arte. Ela ilustrou a autobiografia do beatle, "A Twist of Lennon", lançada em 1978 |
Tempos depois, eu tomaria
conhecimento definitivo dos Beatles. Cheguei até a publicar um livro, A revolução dos Beatles, nos 35 anos da
sua primeira gravação, que aconteceu em Abbey Road num 11 de setembro mais
ameno, o de 1962, quando eu tinha um mês de Londres na minha residência de três
anos na BBC.
Cynthia e John Lennon Reprodução HippiKiz |
Colega de Lennon na escola de
artes de Liverpool, Cynthia Powell tingiu os cabelos de louro porque ele era
apaixonado por Brigitte Bardot. Casaram-se, ainda em Liverpool, porque ele
engravidou a moça. Mas os Beatles mantiveram por muito tempo a farsa de que
Lennon era solteiro – como podiam suas fãs desejar um Beatle casado e com
filho? Já naquele apartamento de Emperors Gate, John traiu Cynthia com a mulher
do vizinho fotógrafo de moda, uma manequim norueguesa – nasceu daí a canção Norwegian Wood. Mrs. Lennon foi botando
panos quentes na relação até o dia em que, voltando antecipadamente de férias
na Grécia – a mando de John – encontrou o marido e Yoko Ono na sua mansão em
Kenwood vestindo roupões brancos iguais e num indisfarçável clima de
intimidade.
Em sua autobiografia de 1978, A
Twist of Lennon (trocadilho com “uma gotinha de limão” das receitas de
coquetel), Cynthia descreve: “Quando abri a porta fui confrontada com uma cena
que me tirou o fôlego e a voz. Pratos sujos do café da manhã estavam empilhados
sobre a mesa, as cortinas estavam fechadas e o quarto com uma iluminação
difusa. Diante mim, John estava sentado relaxado em seu roupão. De costas para
mim, e igualmente relaxada e à vontade, estava Yoko. ‘Oi’ – foi tudo o que
disseram.”
John Lennon foi assassinado a
tiros em Nova York em 1980. Cynthia Lennon morreu de câncer aos 75 anos neste
1º de abril em Palma de Maiorca. Yoko Ono continua firme, rolando pelo mundo,
aos 82.
Requiescat in pace, Cyn. . .