O relato publicado em post anterior, de Jussara Razzé, foi escrito em 2008, oito anos após a falência da Bloch. Em um trecho, a autora foi premonitória ao escrever "já saber que teria que lutar anos na justiça para receber indenizações, salários atrasados, FGTS etc".
Massas falidas são entidades que costumam ter a lentidão de um paquiderme a caminhar em um lamaçal. Gastam anos para cumprir seus objetivos, estão sujeitas a acidentes jurídicos de percurso que atrasam processos e, enquanto isso, montam um estrutura que, para se manter, vai consumindo o patrimônio da empresa falida.
Durante quatro anos a partir da falência, muitos ex-funcionários bateram portas em busca de informações sobre seus direitos. Foi um tempo de desorientação, de empurra-empurra, de desrespeito. Um desses ex-funcionários era José Carlos de Jesus, ex-chefe de reportagem da Manchete e ex-coordenador dos Cursos Bloch de Jornalismo e de Fotografia. Diante das dificuldades e da falta de informação e preocupado por saber que bens da empresa falida já eram vendidos em leilões, ele mobilizou um grupo de colegas, conseguiu uma audiência com a Juíza Maria da Penha Nobre Mauro, da 5ª Vara Empresarial, à frente da Massa Falida da Bloch Editores, para começar a entender, como credor trabalhista, o funcionamento daquele "monstro" burocrático do qual todos dependiam para receber o que a Bloch devia aos seus ex-empregados.
Havia patrimônio suficiente para cobrir a dívida trabalhista. Mas o histórico de muitas falências, especialmente de empresas jornalísticas, é o calote puro e simples, na cara de pau. Pense em algum extinto veículo do Rio, por exemplo, e encontrará um pilha de processos inconclusos e montanhas de dívidas trabalhistas.
Daqueles primeiros encontros com autoridades da Massa Falida da Bloch, surgiu a Comissão dos Ex-Empregados da Bloch Editores. Incansável, José Carlos abriu canais de comunicação e de informação, passou a convocar assembleias dos ex-funcionários e a acompanhar o andamento do paquiderme. A primeira vitória foi o pagamento das indenizações aos ex-funcionários então habilitados, aí por volta de 2005. Estes receberam o chamado "valor principal". Ficou faltando a correção monetária devida. A segunda vitória foi o recebimento de uma parcela dessa correção. Nos anos seguintes, vieram mais duas parcelas. Na época, alguns advogados de renome e com vasta experiência no ramo, foram unânimes em reconhecer que sem a persistência de José Carlos e as reivindicações que encaminhava aos vários síndicos da Massa Falida, ao promotor do Ministério Publico e à juíza, tais pagamentos seriam postergados, como normalmente acontece. Aquelas vitórias foram importantes, mas infelizmente não se repetiram. Os credores trabalhistas passaram a acumular derrotas. Viram a justiça determinar que um item valioso do patrimônio da extinta Bloch - as obras de arte do Museu Manchete, que abrigava na sede da Rua do Russell a Coleção Manchete de Arte Moderna Brasileira - deveria se partilhado com os herdeiros de Adolpho Bloch, e mais, que esses herdeiros teriam o privilégio de escolher no acervo as obras mais valiosas. Os vários testemunhos que demostraram ao longo do processo que as obras de arte eram da empresa e não de pessoas físicas foram desprezados pela justiça. Outra derrota catastrófica foi a justiça desqualificar a TV Ômega como sucessora da TV Manchete. Com isso dívidas trabalhistas de ex-funcionários da Bloch que provaram trabalhar também para a TV Manchete e que haviam sido pagas inicialmente pela Õmega, compradora da TV dos Bloch, foram debitadas à Massa Falida da Bloch. E essa conta vai a milhões.
O fato é que, 20 anos depois, os ex-funcionários da Bloch ainda têm a receber. Ultimamente, José Carlos Jesus encaminhou pedidos à Massa Falida para a realização de pagamento de pelo menos mais uma parcela da correção monetária devida. Aparentemente, não foi ouvido. Isso apesar de ter até mesmo argumentado que a Covid-19 agravou a situação de muitos ex-funcionários da Bloch, o que é verdade comprovável. Uma angústia que é crescente à medida que o tempo passa e se sabe que o patrimônio que deveria garantir tais pagamentos sofre o risco permanente de ser consumido pela burocracia e por decisões judiciais como as exemplificadas acima.
ATUALIZAÇÃO em 01~8-2020 . Em mensagem enviada ao blog, José Carlos Jesus, presidente da Comissão dos Ex-Empregados da Bloch Editores e há quase 20 anos mobilizando os demais credores trabalhistas da extinta empresa, pede que seja registrado o justo reconhecimento pelas atuações da Juíza Maria da Penha Nobre Mauro e do ex-Promotor e hoje Desembargador Luiz Roldão de Freitas. À primeira, que permanece à frente da Massa Falida da Bloch Editores, e o segundo, que teve atuação no processo como representante do Ministério Público, Pela integridade, pela visão humana da lei, pelo respeito com que tratam e trataram os ex-empregados da Bloch, ele reitera que só tem a agradecer.
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quarta-feira, 29 de julho de 2020
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