quarta-feira, 25 de junho de 2025

Adeus, Lena Muggiati

 

Lena Muggiati em frente ao Palácio de Buckingham, em 1986. Depois de cobrir o casamento do príncipe Andrew com Sarah Ferguson, ela aguardava o beijo do casal na famosa sacada da residência real. 

Lena Muggiati fez parte daquela geração de jovens fotógrafas que pontificaram nas décadas de 80 e 90 nas páginas da Manchete e de outras revistas da Bloch: Cibele Clark, Cristiane Isidoro, Gilda Estelita, Isabel Garcia, Márcia Ramalho, Margaret Lippel e Paula Johas. Lena tinha um diferencial: era casada com o editor da Manchete, Roberto Muggiati, e isso, mais do que uma vantagem, podia ser um empecilho. Muito antes da internet e do celular, as redes antissociais já vicejavam nos corredores de Frei Caneca e do Russell. O primeiro grande ensaio de Lena – dezesseis páginas sobre o Jardim Botânico, com direito a uma exposição no próprio JB – foi paginado na gestão do editor Justino Martins.


Muggiati e Lena acabaram encontrando o seu caminho e participaram juntos de grandes coberturas, como a dos maiores festivais de jazz da época. No 1º Free Jazz, o close que fez de um Chet Baker envelhecido, a três anos da morte, ganhou a capa do caderno cultural do Valor Econômico. A foto do Chet rejuvenescido tocando trompete no gran finale do evento foi usada por Walter Salles como capa do livro do fotógrafo (Peter Coyote) protagonista do filme “A grande arte”. 


Ainda em 1985,  Lena registrou o lendário “duelo no Montreux Corral” entre João Gilberto e Tom Jobim. No ano seguinte – ainda se recuperando do parto da filha Natasha – viajou de Montreux a Londres para cobrir o casamento do Príncipe Andrew; nas horas de folga fez um ensaio de treze páginas para a série Viagens Imaginárias, “A Londres de Sherlock Holmes”. De volta ao Rio para o Free Jazz, seguindo uma ideia da revista Life durante o Live Aid, Lena montou um estúdio no Hotel Nacional pelo qual fez passar para fotos posadas as estrelas do 2º Free Jazz, veteranos como Gerry Mulligan e revelações como Wynton Marsalis e Stanley Jordan. 


Uma foto de Miles Davis em Montreux, um halo mágico envolvendo o bocal do trompete, ilustrou uma caixa de doze K7s da Sony Music, num projeto gráfico premiado. Em quinze anos de festivais, depois de obter a foto definitiva do músico tocando, ela cultivou o hobby de fotografar o calçado de cada um. A “brincadeira” foi levada a sério e rendeu uma exposição (no Rio e em Brasília), “Aos pés do jazz” - em que o sapato refletia admiravelmente a personalidade do artista.

Lena fotografou também grandes nomes da música brasileira, com retratos consagrados de Ivan Lins, Nara Leão, Artur Moreira Lima e Arrigo Barnabé. Um dia, a caminho da casa de Hermeto Pascoal, parou numa loja do Catete e comprou um pano preto que serviu de fundo para uma foto do Bruxo tocando bombardino com um papagaio empoleirado na campana do instrumento.

O casal sofreu um dia insólito episódio de bullying patronal quando Muggiati ia partir com a família para o repouso no chalé de Itaipava antes de encarar mais um fechamento da edição de Carnaval. Toca o telefone, era Adolpho, meio desenxabido queixando-se de que sertanejos não eram matéria para a Manchete. Foi o mago das finanças da Rede Manchete – conhecido como “a raposa escolhida para cuidar do galinheiro” – quem levantou a maledicência de que os Muggiati estavam levando propina para publicar matérias sobre as duplas sertanejas. A nova sensação da música brasileira não precisava da Manchete, essa é que precisava dos sertanejos para vender revistas.

Esta evidência veio à luz quando Jayme Monjardim escolheu a temática sertaneja para a novela que sucederia o fenômeno “Pantanal”: “Ana Raio e Zé Trovão”. O castigo veio literalmente a cavalo com o espetáculo – bizarro e bisonho – de Adolpho Bloch e Anna Bentes fantasiados de vaqueiros distribuindo chapelões no lançamento de gala da novela.



Gugu Liberato pleiteava em 1995 um canal de TV e Lena foi escalada para fazer uma foto de capa. Embora sofresse na época a doença do pânico, ela se aventurou a atravessar o Viaduto do Chá até a Praça do Patriarca, o local da megalópole com mais transeuntes por metro quadrado. Sabia o que queria e encontrou no camelódromo da praça: um apontador de lápis no formato de um aparelho de TV. O maleável apresentador, líder absoluto do Ibope na época, topou posar com o brinquedinho. A foto foi capa da Manchete e da Amiga – um comentário irônico sobre a audácia do jovem de 36 anos que brigava por um canal próprio de TV para competir com magnatas como Roberto Marinho, Adolpho Bloch e Silvio Santos. 

Depois de ver desfilarem por suas lentes jazzistas, sertanejos, televisivos, escritores e empresários, Lena se dedicou aos animais, que considerava mais confiáveis que os humanos. Passou os dois últimos anos da carreira no Jardim Zoológico do Rio, fotografando as mais variadas espécies para a revista Geográfica Universal. E conseguiu um feito alcançado por ninguém: a amizade do lendário Macaco Tião, com quem conversava por horas, sabe-se lá em que língua.

Lena Muggiati morreu de pneumonia aos 74 anos numa casa de repouso de Correias, RJ, no dia 30 de maio.

segunda-feira, 23 de junho de 2025

O legado de Leon Eliachar



Leon Eliachar, um "Cairoca"

por Ediel Ribeiro (*)

Rio - Outro dia, numa entrevista que dei, me perguntaram sobre as minhas influências no desenho de humor. Falei de Robert Crumb, Palomo e Angeli. Mas também tenho meus ídolos e influências na minha escrita. Sou fã de João Saldanha, Nelson Rodrigues, Jaguar e Ruy Castro. Mas, os que mais influenciaram no meu estilo de escrever humor foram Art Burchard, Woody Allen, Luiz Fernando Veríssimo, Carlos Eduardo Novaes e Leon Eliachar.Tenho quase todos os livros dos três últimos. Aliás, do Leon Eliachar, tenho todos. Até porque sua carreira foi interrompida prematuramente, quando estava no auge.Foi assassinado, no seu apartamento, no Rio de Janeiro, em 29 de maio de 1987, a mando de um marido traído. 

O escritor escreveu “O Homem ao Quadrado” (1960), “O Homem ao Cubo” (1963), “A Mulher em Flagrante” (1965), “O Homem ao Zero” (1967) e “O Homem ao Meio” (1979). 

Além desses, escreveu, em parceria com Millôr, Fortuna, Ziraldo , Jaguar, Claudius, Zélio, Henfil, Vagn e Stanislaw Ponte Preta, o clássico “10 em Humor”, de 1968. 

Leon Eliachar nasceu no Cairo, no Egito, no dia 12 de outubro de 1922. Veio com 10 meses para o Brasil. Nunca se naturalizou, mas era tão brasileiro quanto qualquer brasileiro. Se auto-denominava “Cairoca”.

Foi um dos nossos melhores jornalistas de humor. Começou aos 16 anos escrevendo textos para jornais. Trabalhou em diversos jornais e revistas, entre elas, Manchete , Cruzeiro, Fatos & Fotos, Cigarra, Revista da TV, Fon-Fon, Pif-Paf, Diário de Notícia e Ùltima Hora, onde mantinha uma página com o título de “Penúltima Hora”. Trabalhou ainda nas TVs Tupi, Excelsior, Globo, SBT e nas rádios, Tupi e Mayrink Veiga.

Leon Eliachar tinha um humor “non sense”, espirituoso, inteligente e cáustico. Escrevia admiravelmente bem. Leia seu necrológio, escrito por ele mesmo.

Ei-lo: “O meu quem faz sou eu, que não sou bobo. Detesto a pressa dos jornalistas que querem fechar a página do jornal de qualquer maneira e acabam enchendo o espaço com os lugares-comuns do sentimentalismo. Nada de 'coitadinho, era um bom rapaz', nem que 'era tão moço'. 

Há muito deixei de ser um bom rapaz e nem sou tão moço assim. Quero que o meu necrológio seja sincero, porque de nada me valerá a vaidade depois de eu morrer. Há não ser a vaidade de estar morto. Fui mau filho, mas isso não quer dizer que meus pais fossem melhores filhos que eu se fosse eu o pai. 

Não fui mau marido e acredito que seja porque não tivesse chance de ser, vontade não me faltou. Nunca roubei, nunca menti: esses os meus piores defeitos. Minha grande qualidade era ter todos os outros defeitos. 

Fui egoísta toda vida, como todo mundo, mas nunca revelei nada a ninguém, como todo mundo. Passei a vida tentando fazer os outros rirem de si mesmos: É possível que agora riam de mim. Fui valente e fui covarde. Nunca tive medo de mim mesmo, o que prova a minha valentia. Nunca amei ao próximo como a mim mesmo, em compensação nunca ninguém me amou como eu mesmo. 

Tive milhões de complexos e venci-os todos, um por um, com exceção do complexo de morrer: esse morre comigo. Nunca dei nem tomei nada de ninguém, mas faço questão de deixar tudo o que não tenho para os que têm menos do que eu. Nunca cobicei a mulher do próximo: só a do afastado. 

Jamais entendi perfeitamente o que era o 'bem' e o 'mal', embora a maioria das pessoas me achasse um homem de bem e este era o mal. 

Defendi a minha vida como pude, mas nunca arrisquei a vida para defendê-la. Nunca me preocupei com dinheiro, pois sempre tive pouco. Acreditei mais nos inimigos do que nos amigos, porque os amigos nem sempre se preocupam com a gente. 

Jamais tive um segredo, passei todos adiante. Conquistei muitas mulheres, algumas com os olhos, outras com os lábios e outras com o braço. Tive pavor dos médicos, porque eles sempre descobrem as doenças que a gente nem sabia que tinha há tanto tempo. 

Me orgulho de ter vivido oitenta anos em apenas quarenta. Finalmente, me livrei dessa maldita insônia.”

Leon Eliachar se foi há 38 anos. Em boa hora, diria ele, com seu humor sem auto-piedade.

São suas as frases:

Adultério é isso que liga três pessoas sem uma saber. 

A mulher é uma coisa tão complexa que quando o homem chega a compreendê-la o jeito é abandoná-la. 

A grande conquista da mulher é saber que pode ser conquistada a hora que quiser.


(*) Ediel Ribeiro é jornalista, cartunista e escritor.

Este texto foi publicado originalmente no Facebook do autor. 

Acesse AQUI 


domingo, 22 de junho de 2025

Marx, Lênin, Oscar Wilde, Mark Twain... e eu também fazia parte do clube • Por Roberto Muggiati

Sala de Leitura do Museu Britânico e...

...o cartão de admissão de RM

Em gesto simbólico, o Museu Britânico reativou a carteira de acesso ao seu Salão de Leitura do escritor Oscar Wilde, preso em 1895 por homossexualismo. O anúncio foi feito no domingo, 130 anos depois da condenação de Wilde (por “indecência grave”) à pena de dois anos de prisão com trabalhos forçados. O famoso Reading Room, inaugurado em 2 de maio de 1857 com um café da manhã que incluía champanhe e sorvete, foi frequentado por figuras notáveis, como Karl Marx,  Bram Stoker, Mahatma Gandhi, Rudyard Kipling, George Orwell, Arthur Rimbaud, George Bernard Shaw, Mark Twain, Vladimir Lenin (sob o nome Jacob Richter),  H. G. Wells e Sir Arthur Conan Doyle.

Em 1963, trabalhando no Serviço Brasileiro da BBC, consegui minha carteira para o lendário Salão de Leitura. Aos 25 anos, as atrações mundanas da grande cidade não me deram muita chance para frequentar devidamente aquele templo do saber. Lembro apenas de uma pesquisa de alguns dias que fiz sobre Joseph Conrad, o escritor que eu mais admirava à época e continuo amando. Tocou-me pessoalmente sua avaliação de Londres: “A visão de uma cidade enorme se impunha, uma cidade mais populosa do que alguns continentes e, em seu poder feito pelo homem, como que indiferente às carrancas e sorrisos do céu: uma cruel devoradora da luz do mundo. Havia bastante espaço aqui para situar qualquer história, profundidade bastante para qualquer paixão, variedade bastante para qualquer cenário, escuridão bastante para soterrar 5 milhões de vidas.”  A minha Londres de 1963 soterrava 8 milhões de vidas, entre elas a minha. Com minha cumplicidade...


sábado, 21 de junho de 2025

"Fotojornalista Arquivo" assina foto de Paulo Scheuenstuhl/Manchete no Globo. 'Pode isso, Arnaldo?'



MPB se reúne na casa de Vinícius de Moraes, 1967. Foto de Paulo Scheuenstuhl/Manchete publicada no Globo de 21/6, 2027 e aqui reproduzida em razão de interesse informativo. 



por José Esmeraldo Gonçalves 

A mídia profissional reclama, com razão, da mão leve que as corporações da internet fazem dos  conteúdos jornalísticos. Pois O Globo de ontem publicou na matéria "MPB cantada e contada" uma foto histórica feita por Paulo Scheuenstuhl - fotojornalista falecido há poucas semanas, profissional que integrou a equipe da revista Manchete- e concedeu à imagem apenas um crédito a uma entidade inanimada: "arquivo". 

Fico imaginando o "fotojornalista arquivo" embarcando na Rural Wyllis da Bloch rumo à casa de Vinícius de Moraes, no Jardim Botânico, onde a foto foi feita, e dirigindo a famosa cena, conferindo foco, luz, diafragma etc, antes do clique que registrou mais do que nomes nacionais da MPB uma época virtuosa da cultura carioca. E se o "arquivo", autor de tantas fotos creditadas na mídia, fizesse uma exposição autoral? Precisaria de um Maracanã para reunir suas "obras" de tanto que os veículos lhe atribuem trabalhos. Para quem não sabe, Paulo Scheuenstuhl tinha no seu acervo uma folha de contato com as fotos não editadas dessa mesma cena. São imagens praticamente inéditas de um encontro único e representativo. Esta foto que, segundo O Globo, foi feita pelo "arquivo" talvez seja a mais publicada do fotojornalista da antiga Manchete. E também a mais surrupiada. A imagem chegou a ilustrar em formato gigante a parede da sala de um apartamento na orla de Ipanema pertencente a um executivo da antiga Som Livre. Muitos convidados que frequentavam o espaço teriam parabenizado o anfitrião como "autor" da foto icônica. 

Era comum na imprensa do passado omitir os nomes dos autores de fotos e de textos. Os acervos dos jornais e revistas ainda guardam muitas imagens de autores desconhecidos ou produzidas pela "equipe". Mas não é o caso de uma imagem tão célebre, publicada até em livros, como essa da MPB no terraço da casa de Vinicius de Moraes. O mais incrível é que a foto feita por Paulo Scheuenstuhl inspirou até mesmo a pauta da matéria do Globo, que reuniu em formato semelhante um grupo de artistas da nova MPB. Nem isso motivou o justo crédito.  

Há, atualmente, uma luta intensa dos profissionais da indústria criativa em defesa dos direitos autorais. O objetivo é obrigar as plataformas a pagarem pelo uso dos conteúdos de terceiros que alimentam as redes agora turbinadas pelo voraz mecanismo da IA. E a reivindicação não interessa apenas aos autores, mas diz respeito ao direito à informação autêntica e apurada e à democracia. Um exemplo? O Google já produz "sites informativos", pseudo-jornalísticos, gerados inteiramente pela IA e impulsionados pelos seus próprios algoritmos. Os principais jornais do mundo estão nessa batalha. Respeitar o direito autoral legitima a difícil luta.          

Ruy Castro escreve na Folha de São Paulo sobre o dia em que Cícero Sandroni assustou Adolpho Bloch

 : 

Redação da Manchete, 1971: um caso contado como o caso foi. Reprodução da Folha de São Paulo

quarta-feira, 18 de junho de 2025

Como ganhar uma viagem grátis para Teerã

 


"Mistério na Glicério" - O segundo capítulo de um folhetim policial escrito por Roberto Muggiati

 O blog Panis Cum Ovum publica o folhetim noir "Mistério na Glicério", por Roberto Muggiati, originalmente lançado no República, voz não-oficial da República Independente de Laranjeiras, editado quinzenalmente por Ricardo Linck, do Maya Café.


Clique na imagem para ampliar. Atenção à correção na página 8 ...clorofórmio – conhecida popularmente como Boa Noite, Cinderela.


Memórias da redação: O peixe polêmico do Cícero Sandroni * • Por Roberto Muggiati**

 




Cícero Sandroni com o fotógrafo Antonio Rudge na cobertura para a Manchete da assinatura do acordo atômico
Brasil-Alemanha em 1975

Na ABL


Sandroni na Manchete em 1969

Este episódio surreal é contado sempre de maneira diferente, dependendo do narrador. Como o presenciei de perto, garanto que a minha versão é a correta, exata nos menores detalhes. Cícero Sandroni, jornalista, contista, era uma pessoa culta em processo de mudança e fazia psicanálise há vários anos. Chefe de redação, sentava-se defronte da grande mesa em L do editor, que eu ocupava na época. Um dia, Jaquito cochilou e perdeu uma concorrência importante. Depois de xingá-lo de “cagalhão”, chamamento que usava para todos os parentes empregados na firma, Adolpho o mandou descansar em Cabo Frio. Mesmo com a lancha da Manchete à sua disposição, o agitado Jaquito não aguentou por muito tempo as férias forçadas. Resolveu peitar o tio e voltar antes do tempo de “repouso” que lhe fora imposto. Teve então a ideia de levar um agrado para amaciar o Adolpho. Conhecendo seus gostos, foi à colônia de pesca local e comprou o peixe mais robusto e bonito que encontrou, um cherne, robalo ou garoupa da mais nobre estirpe com quase um metro de comprimento. Assim que chegou ao Russell foi diretamente à cozinha e pediu ao Severino que desse um tratamento de gala ao precioso pescado.

Jaquito, é claro, vangloriou-se ao Adolpho dizendo que ele mesmo tinha fisgado o bicho. (Recorreu aos artifícios da prosa hemingwayana em O velho e o mar, o único livro que leu na vida.) Acertou em cheio na sua aposta. Orgulhoso da obra do seu chef de cuisine – requintada como aquelas peças de ourivesaria que Benvenuto Cellini lavrava para os papas – Adolpho decidiu exibir o prato na redação, antes que ele fosse devorado no restaurante pela alta direção e pelos editores da casa. O acepipe, sobre uma travessa de porcelana, foi trazido numa bandeja de prata. O garçom, mal podendo arcar com o peso do troféu, o depositou no centro da sala, sobre a mesa do Cícero, que havia se ausentado por alguns minutos.

Quando se deparou com aquele espetáculo, o Sandroni ficou profundamente ultrajado. Sempre se sentira diminuído pelo Adolpho, que o chamava de “O Genro”, pelo fato de ser casado com a filha do imortal Austregésilo de Athayde, o mais longevo presidente da Academia Brasileira de Letras. Cícero retirou-se intempestivamente e encaminhou depois seu pedido de demissão.

O desenlace da história fere o sagrado sigilo do divã, mas correu que, na manhã seguinte, em sua sessão de psicanálise diária, ao ouvir o relato do insólito episódio, o analista teria perguntado ao Cícero: “Senhor Sandroni, não acha que está exagerando nestas suas fantasias sobre os Bloch? Um peixe na sua mesa de trabalho!...”

*Cícero Sandroni morreu aos 90 anos na terça-feira, 17 de junho. Nascido em São Paulo, fez uma carreira bem-sucedida na imprensa carioca. Entrou na Bloch no final de 1969 como meu chefe de redação em Fatos&Fotos; foi meu chefe de reportagem e de redação da Manchete em meados dos anos 1970. Eleito para a Academia Brasileira de Letras em 2002, presidente da Casa entre 2007 e 2009, fez parte do que carinhosamente chamamos “a Máfia da Manchete na ABL”: R. Magalhães Jr, Josué Montello, Ledo Ivo, Arnaldo Niskier, Afonso Arinos Filho, Carlos Heitor Cony, Murilo Melo Filho, Geraldinho Carneiro e Ruy Castro. Viveu ainda um episódio curioso como jornalista na gestão galhofeira de Raul Giudiccelli na F&F: Cícero escrevia anonimamente a coluna de Horóscopo e, por uma incrível coincidência, previu o sequestro de embaixador suíço no Rio.

**Esse texto faz parte do livro a ser lançado em breve por Arnaldo Niskier e Roberto Muggiati, O humor na Manchete/Histórias do Grande Circo Adolpho Bloch.

 

segunda-feira, 9 de junho de 2025

Efeito Trump remove livros "suspeitos" de biblioteca pública

Nos Estados Unidos de Trump um Tribunal Federal de Recursos reconheceu o direito de uma biblioteca pública do Texas remover de suas prateleiras 17 livros com conteúdos detestados pelo governo. Vão para a fogueira simbólica livros que contenham questões raciais, sexuais e vulgaridades. Um dos livros condenados foi “They Called Themselves the K.K.K.: An American Terrorist Organization”. Por motivos óbvios: denuncia uma organização de racistas assassinos.

domingo, 8 de junho de 2025

Paulo Scheuenstuhl (1939-2025): versatilidade em fotojornalismo, aventura e arte


A notícia que circulou entre grupos da extinta Bloch certamente deixou um rastro de muita tristeza. Em poucas linhas, era informada a morte do fotojornalista Paulo Scheuenstuhl. Carinhosamente chamado de Paulo Chuchu - uma interpretação mais fácil que os colegas encontraram para driblar as consoantes do sobrenome -  era uma espécie de unanimidade na antiga Manchete. Além do talento que o levou a se destacar em uma extraordinária geração de profissionais, era discreto e focado no trabalho. Seu marketing pessoal estava na qualidade das fotos e na disposição e muitas vezes coragem com que encarava as mais diversas pautas. Networking de corredores, muito comum no clima competitivo da editora, não era com ele. As páginas da antiga Manchete guardam reportagens memoráveis como a que o levou a percorrer e registrar a América do Sul pilotando um frágil, mas bravo, Fiat 157, com o qual cortou a precária, na época, Rodovia Panamericana. Paulo fotografou editoriais internacionais de moda para a Desfile  com a mesma naturalidade com que cobriu a Revolução dos Cravos e a Guerra do Yom Kippur. 


Uma das suas fotos mais famosas foi reproduzida no livro "Aconteceu na Manchete, as histórias que ninguém contou", abrindo uma seleção de imagens épicas dos principais fotográfos da antiga Manchete. Ele eternizou em 1967 um encontro informal e único dos maiores nomes da MPB no terraço da casa de Vinicius de Moraes. Edu Lobo, Tom Jobim, Caetano Veloso, Paulinho da Viola, Chico Buarque, Braguinha, Capinam, Zé Keti, Dircinha Batista, Olivia Hime, Francis Hime, entre outros, posaram para a sua câmera, uma cena histórica que jamais se repetiu.

Paulo Scheuenstuhl faleceu no Rio de Janeiro, em 5 de junho, aos 86 anos. Deixou um acervo que compõe acontecimentos, modas, aventuras, retratos, celebridades, arte e cultura de uma época. 

Cada uma das milhares de imagens que captou eterniza seu talento e profissionalismo. 


Conheça um pouco mais da história de Paulo Scheuenstuhl nesta entrevista extraída do You Tube. 

Clique no link  https://www.youtube.com/watch?v=c14Z1wmEwlk

              


 

sábado, 7 de junho de 2025

Musk versus Trump - Barraco na Casa Branca levanta suspeitas de corrupção e de festins sexuais com adolescentes

 

Jeffrey Epstein, que se suicidou na prisão após condenação
por promover orgias com menores para empresários convidados, e o parça Donald Trump. Reprodução Facebook 




Barraco entre os dois ex-amigos abriu caixa preta de transas e transações.
 A mídia dos Estados Unidos ganhou assunto alternativo à perseguição aos imigrantes, taxação de importações, cerco às universidades e asilo aos brancos da África do Sul "vítimas de racismo, segundo Trump.    

por José Esmeraldo Gonçalves

É um típico caso onde não precisamos escolher um lado, mas torcer pela briga. O barraco entre o homem mais poderoso do mundo contra o mais rico é útil para revelar favorecimentos em contratos que rendiam pilhas de dinheiro público manobrado pela administração Trump e, de quebra, mostrar que em meio a uma ofensiva de supostos cortes de despesas da máquina governamental comandados por Musk foram preservadas transações bilionárias que abastecem os cofres da empresa do oligarca que mantinha gabinete na Casa Branca. Só que no calor da discussão entre os dois ex-amigos Musk soltou uma bomba sexual. Denunciou que o dossiê sobre o Caso Epstein, que durante a campanha Trump prometeu liberar, permaneceu na gaveta. Na verdade, Trump abriu apenas uma parte do dossiê e escondeu os elementos inéditos. Coincidentemente, os trechos em que ele aparece como possível participante na fila do gargarejo dos festins sexuais promovidos pelo empresário Jeffrey Epstein . O Caso Epstein, para quem não lembra, revelou orgias a la carte que reuniam grandes capitalistas, personalidades do set e empreendedoras sexuais contratadas por Epstein. Ele convidava meninas, muitas delas menores de idade, a peso de dólares e viagens luxuosas, para confraternizações sem limites com amigos como o príncipe Andrew. Epstein acabou preso e se suicidou na prisão em 2019. As garotas eram transportadas em jatinhos a que os participantes davam o nome de Lolita Express. Daí Musk insinuar que o evento era sobre uma celebração da pedofilia.   

quarta-feira, 4 de junho de 2025

"Mistério na Glicério" - O primeiro capítulo de um folhetim policial escrito por Roberto Muggiati

A partir desta edição, o blog Panis Cum Ovum publica o folhetim noir "Mistério na Glicério", por Roberto Muggiati, originalmente lançado no República, voz não-oficial da República Independente de Laranjeiras, editado quinzenalmente por Ricardo Linck, do Maya Café.






NO PRÓXIMO CAPÍTULO: CONHEÇA A INVESTIGAÇÃO

segunda-feira, 2 de junho de 2025

Gol de mão não é para "bobos". Maradona está rindo até agora...


 O"gol" ridículo de Neymar. Imagem Reprodução SBT

Argentina 2xInglaterra. Copa de 1986. Maradona faz o gol da mão de deus. O juíz validou o lance. No mesmo jogo o argentino driblou ingleses desde o meio de campo e marcou um dos mais belos gols da história. Deu tudo certo. A Argentina foi campeã, Maradona foi consagrado e décadas depois a bola do gol de mão, guardada pelo árbitro, tunisiano foi leiloada pelo equivalente a 17 milhões de reais. Foto Reprodução You Tube

por José Esmeraldo Gonçalves 

Quase 40 anos depois um gol de mão foi repetido por Neymar, mas como farsa. Foi simbólico. No momento em que o PSG comemorava a conquista histórica que buscava há 14 anos - o festejado título da Champions - o influencer Neymar protagonizou uma das cenas mais ridículas da sua tumultuada carreira. Se vivo fosse, Maradona chamaria o brasileiro de otário. "Se non sabes cómo hacerlo, no lo hagas, carajo".

Neymar foi expulso de campo durante o jogo do Santos contra o Botafogo. Na sequência, o time carioca fez o gol da vitória. Com isso, o influencer só voltará a jogar pelo Santos em julho e isso se renovar o contrato, o que parece difícil.

O jornal Estadão cita uma coincidência:  suspenso, Neymar não jogará conta o Fortaleza, próximo compromisso do Santos. O que o deixa livre para ir a Paris assistir à final da copa da igualmente ridícula Kings League, onde é proprietário de um time. Para quem não sabe a Kings League é uma espécie de roda de bobo para idiotas assistirem e outros apostarem (sim, algumas bets aceinam apostas na modalidade que não está sujeita às entidades ou instâncias da justiça desportiva que fiscalizam e regulam os esportes). Consiste em uma coisa que mistura regras de futebol do tipo recreio da quinta série com toques de reality, video game e babaquices tais. A Kings League está investindo forte no Brasil e é impulsioada por site e canais do You Tube. Na últia final do torneio, em São Paulo, Neymar, pelo menos  distribuiu ingressos gratuítos.