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quarta-feira, 17 de abril de 2019

Fotomemória - Serão as elites comunistas? O que Luiz Carlos Prestes diria sobre isso? Por Guina Araújo Ramos

Rio, 1980: Sozinho, Prestes deixa a sede da Polícia Federal após depoimento. Ele embarca em um Fusquinha, o táxi da época. A simplicidade da imagem contrasta com o séquito, as caravanas, os jatinhos e o exibicionismo policial em torno do depoentes atuais. Foto de Guina Araújo Ramos

por Guina Araújo Ramos (do blog Bonecos da História) 

Em vídeo que viralizou na Internet, o atual Ministro da Educação, Abraham Weintraub, surpreendeu todo o Brasil com uma declaração bombástica: ”Os comunistas estão no topo do país. Eles são o topo das organizações financeiras; eles são os donos dos jornais; eles são os donos das grandes empresas; eles são os donos dos monopólios".

Realmente, para alguém que tenha vivido (ou se informado sobre) as últimas décadas da História do Brasil, parece difícil perceber alguma verdade nesta afirmação. Logo me lembrei de histórica personagem do movimento comunista no Brasil, que batalhou por múltiplas causas políticas no correr de praticamente todo o século XX, e fiquei tentando (mas não fui capaz de) imaginar o que Luiz Carlos Prestes diria disso...

Tentando entender o momento atual, acabo de encarar a maratona de leitura da sombria trilogia “Os Subterrâneos da Liberdade”, romance memorialista de Jorge Amado, formada pelos livros “Os ásperos tempos”, “Agonia da noite” e “A luz no túnel” (e nem este título alivia o terror que foram aqueles tempos). O autor faz um balanço da ditadura do Estado Novo e descreve a situação desesperadora dos militantes comunistas, perseguidos e torturados pelas forças policiais, ao mesmo tempo que explorados como força de trabalho pelos grandes proprietários, em indústrias e latifúndios. Ao fundo das cenas, além de Getúlio Vargas, se equilibrando entre fascistas alemães (e seus apoiadores integralistas) e imperialistas americanos (e seus sócios da burguesia local), estava todo o tempo a figura de Prestes, o mais importante preso político da época.

Com o fim do Estado Novo, Prestes foi anistiado em 1945, eleito senador pelo Rio e deputado constituinte (assim como o próprio Jorge Amado), vivendo um momento de liberdade que durou apenas até a “redemocratização” do país cassar tanto o partido quanto seus parlamentares...
Mais uma vez perseguido pela ditadura de 1964, Prestes manteve-se na clandestinidade até 1971, conseguindo então sair do país, para se exilar na antiga URSS.

Rio, 1979. Prestes volta do exílio e desembarca no Galeão. O líder comunista fala à multidão,
que reunia delegações de vários estados. Foto de Guina Araújo Ramos.

Prestes acena e agradece a recepção. Foto de Guina Araújo Ramos. 

Apenas no retorno do exílio, em 1979, tive oportunidade, é lógico, de fotografá-lo. E logo desde a chegada, ainda no aeroporto do Galeão (o hoje Tom Jobim), como parte de uma série de coberturas de retornos de exilados (incluindo Fernando Gabeira e Miguel Arraes) para as revistas da Bloch Editores, fotografando para a Manchete, sempre a cores, ou para Fatos & Fotos, em preto-e-branco.
A chegada de Prestes foi das mais concorridas, uma verdadeira multidão encheu o saguão do desembarque e se espalhou pela pista de acesso ao aeroporto, uma verdadeira aclamação.

A partir de 1980, agora pelo Jornal do Brasil, fazendo dupla com o repórter Carlos Peixoto, voltei a registrar os passos de Luiz Carlos Prestes. A princípio, acompanhando a maratona de intimações que sofreu uma delas em outubro, obrigado a comparecer à Polícia Federal, para prestar depoimentos em diversos processos, ainda dentro do quadro da ditadura de 1964. Ficou evidente que mantinha a postura altaneira, muito bem demonstrada na chegada do exílio, mas apresentou também, talvez por fidelidade às suas causas, grande simplicidade.Basta ver que, depois de horas de depoimento, e de ser acossado pelos jornalistas por longos minutos à saída, simplesmente deu alguns passos para um pouco mais distante da Polícia Federal do Rio de Janeiro, em direção à Praça Mauá, fez sinal para um táxi e lá foi ele embora em um fusquinha...

Na sequência da década de 1980, no correr dos eventos políticos em torno do governo João Figueiredo, que levaram ao fim da ditadura, Prestes volta à luta política, agora na legalidade. E resolveu apoiar, ainda que com ressalvas, a candidatura de Leonel Brizola ao cargo de governador do estado do Rio de Janeiro. Nesta campanha, fotografei Luiz Carlos Prestes em contato direto com os operários, a categoria central da classe social cujas causas, na condição de comunista declarado, sempre defendeu. Protegido por um boné em que se lia “Brizola na cabeça”, Prestes falou aos funcionários de estaleiros navais da Ponta d’Areia, bairro operário de Niterói. Apesar do apoio a Brizola na campanha de 1982, Prestes não se integrou ao seu governo, mantendo sempre postura crítica, com presença constante nas manifestações pela mudança do regime ditatorial. Foi já no governo Sarney, em 1986, que o fotografei pela última vez (em um frila para não sei mais que revista), em um evento na ABI, à frente de uma faixa que falava, muito justamente, algo como “o povo não vai pagar esta dívida”... 

Trazendo toda esta trajetória de vida política para este preocupante momento atual, quando novas formas de autoritarismo afloram e, como se percebe das falas de ministros e de outros políticos, há uma tentativa de fazer com que tanto conceitos como a própria História do Brasil sejam forçadamente reescritos, volto, um tanto espantado, à pergunta inicial: como Luiz Carlos Prestes, em outros tempos o Cavalheiro da Esperança, hoje em dia, se estivesse entre nós, ele que deixou como herança toda uma vida de luta contra as poderosas, bem como destruidoras, elites brasileiras, encararia estas inesperadas afirmações?

Afinal, as elites brasileiras (financeiras, midiáticas, empresariais, monopolísticas) são (ou serão) comunistas?

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sexta-feira, 8 de abril de 2016

"Workshop" discute diagramação de fotos e mostra como imagens históricas seriam publicadas pela mídia atual

por Omelete
O recente episódio em que um jornal parou as máquinas para mudar o corte de uma foto na primeira página, como noticiado em sites de análise do jornalismo e neste blog, gerou no meio profissional discussões sobre a motivação do veículo ao mandar limar a palavra "Força" que aparecia ao lado de uma imagem recente de Dilma na cabine de um avião da FAB.

Durante um workshop em um pé-sujo da Lapa, após acaloradas discussões, o recurso foi apontado como censura à diagramação e visto como um sinal desses tempos que vivemos no jornalismo.

A pergunta é: se o deputado Barreto Pinto, os presidentes JK e Jânio e o ditador João Figueiredo fossem fotografados hoje será que suas imagens icônicas - para usar uma palavra comum em workshops - passariam íntegras pela diagramação vigiada pelas direções dos veículos atuais?

Veja nas reproduções, ontem e hoje, exemplos comparativos da nova técnica da  "diagramação assistida". Um detalhe: três das fotos antológicas, abaixo, foram feitas para o saudoso Jornal do Brasil, cujos fotógrafos e editores tinham, em várias épocas, um olhar preciso para a foto que dispensava legendas.

Ontem: a foto do Barreto Pinto de cuecas foi publicada em O Cruzeiro, em 1946.
e custou o mandato do deputado. Reprodução/Foto de Jean Manzon. 

Hoje: com corte para evitar a leitura política. 

Ontem: a foto reproduzida acima rendeu a interpretação de que JK pedia dinheiro a Foster Dulles.
Foi publicada no Jornal do Brasil, em 1958. É de autoria do fotógrafo Antonio Andrade
Hoje: "Com jeitinho brasileiro JK argumenta questões diplomáticas". 

Ontem: às vésperas da renúncia, Jânio, em crise de indecisão
política,  troca os pés. Reprodução da foto de 1961 feita por Erno Schneider para o Jornal do Brasil.

Hoje: o ex-presidente é visto apenas "atendendo ao
chamado de um popular que o apoiava". 

Ontem: em plena ditadura, 1979, a menina recusa o cumprimento de Figueiredo.
Foto de Guinaldo Nicolaevski para o Jornal do Brasil.
Hoje: Figueiredo como sairia atualmente, provavelmente "cansado
das pressões da linha-dura".