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sábado, 24 de outubro de 2015

De santos, sapateiros e Shakespeare


Por ROBERTO MUGGIATI
Vinte e cinco de outubro, dia dos Santos Crispim e Crispiniano, é o Dia do Sapateiro. Desenhos datados de 10.000 a.C. mostram sapatos em cavernas da Espanha e  da França, embora estudiosos falem de um histórico de cerca de 3000 aC. Lembro do meu avô, Pietro Giovanni Diego Muggiati, registrado no Brasil como Diogo Muggiati, que começou a vida como sapateiro e se tornou industrial de calçados. Lembro do pai da mocinha em A TALE OF TWO CITIES, de Dickens, que fazia sapatos em sua cela na Bastilha. E dos santos mártires Crispim e Crispiniano, que pregavam durante o dia e faziam sapatos à noite. Vejam só: o costume de deixar um sapato para Papai Noel encher de presentes nasceu com eles. A história dos dois foi encampada também pelo sincretismo afro-brasileiro.
Crispim e Crispiniano eram irmãos de origem romana. Cresceram juntos e converteram-se ao cristianismo na adolescência. Ganhando a vida no oficio de sapateiro, eram muito populares, caridosos, e pregavam com ardor a fé que abraçaram. Quando a perseguição aos cristãos ficou mais insistente, os dois foram para a Gália, atual França.
As tradições seculares contam que, durante a fuga, na noite de Natal, os irmãos Crispim e Crispiniano batiam nas portas buscando refúgio, mas ninguém os atendia. Finalmente, foram abrigados por uma pobre viúva que vivia com um filho. Agradecidos a Deus, quiseram recompensá-la fazendo um novo par de sapatos para o rapazinho.
Trabalharam rápido e deixaram o presente perto da lareira. Mas antes de partir, enquanto todos ainda dormiam, Crispim e Crispiniano rezaram pedindo amparo da Providência Divina para aquela viúva e o filho. Ao amanhecer, viram que os dois tinham desaparecido e encontraram o par de sapatos cheio de moedas.
Quando alcançaram o território francês, os dois irmãos estabeleceram-se na cidade de Soissons. Lá, seguiram uma rotina de dupla jornada, isto é, de dia eram missionários e à noite, em vez de dormir, trabalhavam numa oficina de calçados para sustentar-se e continuar fazendo caridade aos pobres. Quando a cruel perseguição imposta por Roma chegou a Soissons, era época do imperador Diocleciano e a Gália estava sob o governo de Rictiovaro. Os dois irmãos foram acusados e presos. Seus carrascos os torturaram até o limite, exigindo que abandonassem publicamente a fé cristã. Como não o fizeram, foram friamente degolados, ganhando a coroa do martírio.
A Igreja celebra os santos Crispim e Crispiniano como padroeiros dos sapateiros no dia 25 de outubro. Essa profissão, uma das mais antigas da humanidade, era muito discriminada, por estar sempre associada ao trabalho dos curtidores e carniceiros. Mas o cristianismo mudou a visão e ela foi resgatada graças ao surgimento dos dois santos sapateiros, chamados de mártires franceses.

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Aqui no Brasil, a devoção trazida pelos portugueses misturou-se com o culto aos Espíritos meninos (Ibejis ou Erês) da tradição africana.
A falange de Ibejí, também chamados "crianças" é composta de meninos e meninas de todas as raças e idades. Em geral, as cores que os representam são o azul e o rosa, sendo que geralmente são conjugadas com o branco. Os Ibeji são chamados de Erês e também de Curumins. São Cosme e São Damião são os padroeiros das crianças, dos médicos e farmacêuticos. Também são sincretizados com os Ibeji.

Hino a São Crispim e São Crispiniano

Dois exemplos da Santa Humildade, 
Que renega o fastígio do mundo,
Trocam fausto, riquezas, vaidade
Pelo amor do trabalho fecundo.
CORO
São Crispim, nosso provido guia! 
Crispiniano, da cruz mártir santo!
Consegui que possamos, um dia,
Repetir lá no Céu este canto!
A oficina dos santos obreiros
É, então, um sacrário de luz,
Onde todos acorrem ligeiros
Ao chamado da voz de Jesus.
Mas dos ímpios o féro delírio, 
Aos clarões da verdade singela,
Os dois santos conduz ao martirio, 
Que milagres de Fé mais revela.
Coroados, por fim, com as palmas,
Que aos justos reserva o altar,
Jubilosas estão nossas almas
Seus louvores e glória a cantar.

Gira de Ibeji - Cosme e Damiao, Mariazinha, Doum, Dois Dois, Zezinho, Caboclinho Crispim Crispiniano, VEJA O VÍDEO, CLIQUE AQUI

Shakespeare e São Crispim/Crispiniano
Amanhã a Batalha de Agincourt (1415) faz 600 anos. A batalha é o ponto alto da peça de Shakespeare, Henrique V. Antes de lançar à luta seu exército esgotado – numericamente inferiorizado na razão de cinco a um - contra os franceses bem descansados, o Rei exorta seus soldados num discurso famoso – o discurso de São Crispim.
Nós brasileiros costumamos usar expressões famosas de uma maneira rasa, sem saber seu verdadeiro significado. Assim, quando citamos “the happy few”, pensamos nos poucos eleitos para fama e fortuna, para desfrutarem uma vida de felicidade e prazeres.
Os “happy few” de Henrique V são os poucos eleitos para morrerem em batalha. Vejam o discurso abaixo.
This story shall the good man teach his son;
And Crispin Crispian shall ne’er go by,
From this day to the ending of the world,
But we in it shall be remembered-
We few, we happy few, we band of brothers;
For he to-day that sheds his blood with me
Shall be my brother; be he ne’er so vile,
This day shall gentle his condition;
And gentlemen in England now-a-bed
Shall think themselves accurs’d they were not here,
And hold their manhoods cheap whiles any speaks
That fought with us upon Saint Crispin’s day.



VEJA O DISCURSO DE HENRIQUE V NA INTERPRETAÇÃO DE KENNETH BRANAGH, CLIQUE AQUI