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sexta-feira, 21 de junho de 2013

O despertar dos “Gigantes”

Passeata dos 100 mil. 1968. Foto: Reprodução Internet/Jornal do Brasil
por Nelio Barbosa Horta
Todos que acompanharam as manifestações populares ocorridas em todo o País, ao longo desta semana, com passeatas pacíficas (a maioria), mas infelizmente com "bandidos" infiltrados no movimento, principalmente no Rio de Janeiro, em São Paulo e em Brasília, guardarão o fato na memória como "a noite do vandalismo", devido à baderna generalizada da  última quinta-feira. Vândalos, munidos até de "coquetéis molotov", derrubaram postes, saquearam lojas, quebraram orelhões e vidraças de estabelecimentos comerciais e ônibus, 26 radares destruídos e uma grande quantidade de feridos. Sabem quem vai pagar o prejuízo? Mais uma vez, o povo.
No Rio, cerca de um milhão de pessoas, entre jovens, estudantes ou trabalhadores de todas as áreas,  ocuparam as principais avenidas em busca da manifestação que sensibilizasse as autoridades do País para a desigualdade social existente, com a inflação batendo a porta das famílias, onde o preço das passagens dos ônibus foi apenas um pretexto para extravazar toda a insatisfação da população, pressionada por tantas injustiças sociais, tanta corrupção, tantos desmandos, sem que a sociedade fosse ouvida e pudesse opinar.
Acreditem:  O "Gigante Brasil" despertou. Acho que este movimento poderá se repetir em outras ocasiões, sempre que as injustiças sociais ficarem mais evidentes e continuarem "sufocando" este povo, quase sempre pacífico. A mobilização é rápida.
Todos  acompanharam pela Globo, a espetacular cobertura do JN, desde as 17h30 de ontem até ás 21h30, sem interrupção com um trabalho digno de registro. De várias cidades e capitais, Repórteres e cinegrafistas foram colocados em pontos estratégicos, no alto de edifícios, onde tinham uma visão privilegiada de tudo. Parecia que eles já sabiam do que ia acontecer. O "Gigante" da comunicação também precisa despertar. Que tal uma mudança na "grade" de sua programação?  Em vez de tantas novelas seguidas, programas mais educativos como "O Globo Repórter", "Profissão Repórter", "Globo Comunidade", "Globo Mar" em horários mais nobres e com o JN  em edições diurnas e com os âncoras  "falando mais devagar", sem atropelar as matérias que acabam pouco compreendidas pelos ouvintes.
A  Globo com a grande estrutura que tem e seu grande poder de audiência deveria ajudar na educação dos jovens, com debates sobre os problemas do dia a dia enfrentados pelas famílias, inclusive sobre manifestação popular pacífica, que é o perfil da população brasileira.
Em 1968, no auge da repressão, estudantes, artistas e a população,  participaram de passeata sem a baderna generalizada dos atuais movimentos.   (
Nelio Barbosa Horta, de Saquarema)

terça-feira, 7 de agosto de 2012

São Cristóvão: um bairro que era feliz e não sabia

Quinta da Boa Vista - Ilha dos Amores
Palácio Imperial, na Quinta, abriga o Museu Nacional de História Natural
por Nelio Barbosa Horta
São Cristóvão foi o bairro onde passei a maior parte da minha infância e adolescência, lá pelos anos 50 do século passado... Era um bairro de classe média, para baixa, com uma população onde havia grande predominância de famílias portuguesas que vinham morar aqui, influenciadas principalmente pelo Clube de Regatas Vasco da Gama. Era um bairro adorável e que, acreditem, rivalizava com a Tijuca, o "primo rico" que ficava próximo, no que diz respeito à festas, realizadas nas grandes mansões que haviam no bairro, à educação, onde os colégios eram disputados, devido à qualidade do ensino. Tinham alunos que vinham de outros bairros,  para buscar vaga nos colégios do chamado Bairro Imperial. Havia o Colégio Brasileiro de São Cristóvão, instituição centenária que era considerado de elite no bairro, a Escola Gonçalves Dias, de curso primário , e o Pedro II, no Campo de São Cristóvão, e o Pio Americano e o Instituto Cylleno, ambos na Rua São Januário, onde estudei o primário, o admissão (no meu tempo havia) o ginásio e parte do científico.
Onde é hoje o Pavilhão, havia um campo imenso, descampado.  Nos fins de semana, peladeiros jogavam cerca de dez, doze partidas ao mesmo tempo pela manhã. Tinha uma arquibancada, de ferro, importada, toda trabalhada, linda, que estava lá desde não sei quando, e também não sei para onde foi levada. À tarde, uma parte do campo era destinada aos jogos do Primeiro de Maio, timaço da época que ficou um ano sem perder. A arquibancada ficava lotada para ver jogadores amadores, verdadeiros craques que fariam sucesso em qualquer time de hoje.  Havia  uma grande feira, aos domingos, onde meu pai comprava os Gibis e o Tico-Tico que eu "devorava" no mesmo dia.  A Quinta da Boa Vista era um verdadeiro Central Park , onde havia todo tipo de comemoração, e o lugar preferido dos moradores que faziam pic-nic em volta dos lagos, os famosos barcos à remo e aIlha dos Amores onde os casais de namorados trocavam despreocupadas confidências.
Os namoros naquela época eram cercados de severa fiscalização das mães, tias, avós e irmãos que, no máximo,permitiam encontros nas festas do Grêmio, aos sábados, que eram realizadas entre quatro horas da tarde e oito da noite. As garotas achavam, com alguma razão, que os jovens eram terríveis e tinham mesmo que ser policiados. As normalistas preferiam os cadetes e a "cachorrada" como eram chamados os alunos dos outros colégios. Em algumas festas, nos casarões, havia a presença de conjuntos de renome, como o de Rago, (jamais te esquecerei...)  e os romances, infinitos enquanto durassem... 
Havia, as professoras e todos nós em algum momento nos apaixonamos perdidamente por alguma, ou várias professoras. Paixão secreta, nunca revelaremos nossa preferência.  Algumas já senhoras, gordas, lembravam nossas mães e eram respeitadas. Mas tinham outras, bonitas, morenas e louras  que, quando andavam, pareciam flutuar, mas que reprovavam sorrindo sem piedade com suas equações e polinômios. A professora de matemática era o terror dos alunos do científico.  Tinha carinho  somente pelos sonsos e quietinhos do primeiro ano ginasial.
Moradores ilustres povoaram o bairro, como a ex-cantora Olivinha Carvalho filha do "seu" Carvalho e que morava na Rua Curuzu. A irmã dela era belíssima, mas era noiva do Dodô, goleiro do Luzitânia, time  da Rua  Major Fonseca, onde mais tarde também joguei. Havia corrida de bicicleta em volta das praças,  subindo e descendo as ruas.  Nunca mais encontrei com ninguém daquela época. O Baden Powell, que foi da minha sala no ginásio e que morava na Rua São Januário, aniversariava no mesmo dia que eu: 6 de agosto. Depois das aulas  íamos para a casa dele escutar em primeira mão, músicas que seriam sucesso bem mais tarde. O primo dele, o João de Aquino, também era morador, além dos jogadores famosos como o Ademir Menezes, o"queixada" que morava numa belíssima casa na Rua Coronel Cabrita. Os compositores Paquito e Romeu Gentil, (daqui não saio, daqui ninguém me tira...) também moravam no bairro  e muitos outros. Dizem que o Sílvio Caldas iniciou sua carreira em São Cristóvão. Lembro de algumas serestas feitas pelo cantor Orlando Correia, na Praça Argentina. A Escola de Samba Paraíso doTuiuti iniciava seus desfiles passando pela Praça, com uma coreografia modesta mas que nós achávamos original e belíssima.  Nesta época, não haviam as famosas "Rainhas daBateria",  só moradoras do Tuiuti e adjacências.
O forte futebol do Clube de Regatas São Cristóvão, foi,  por muito tempo, celeiro de craques, como o Ronaldo "Fenômeno" mais recentemente e o Dejair, do Vasco, daquela época. A poda do gramado era garantida pelas quatro cabras,manejo mais econômico e que não faziam greve nunca... Tinha também o São Cristóvão Imperial, clube mais sofisticado e palco dos maiores eventos sociais do bairro. Os bailes de Carnaval eram realizados  nos salões do Vasco, bem maiores, e à entrada formavam-se filas enormes. No carnaval  de rua, os moradores andavam de bonde, cujo ponto final do bonde São Januário (53) era na Praça Argentina. Os jovens brincavam nos estribos nas famosas Batalhas de confete e de lança-perfume.  Acho que a maioria nem sabia do poder tóxico deste produto. 
Durante o tempo de São Cristóvão, sempre morei nas chamadas Casas de Cômodos. Eram casarões antigos, cujos quartos eram alugados para as famílias pobres. Só havia um banheiro para todos e "filas" para se usar os banheiros... Precursores dos atuais condomínios, tinham regulamento, como, por exemplo, os rádios (TV era muito raro) não podiam ficar com o som muito alto, o  horário para entrada na casa, que era até as 11 horas, os gatos tinham que ter nas portas dos quartos, uma portinhola que eles  usavam para entrar em casa depois das seus prazeres mundanos. A água e a luz eram racionadas e muito "barraco" foi levantado devido aos excessos de alguns moradores, inconformados com a economia forçada.
Existe ainda hoje o Observatório Nacional, inaugurado pelo Imperador Pedro II e a casa da Marquesa de Santos (Museu do Primeiro Reinado). Além de prédios históricos espalhados pelo bairro, São Cristóvão possui diversas atividades culturais, especialmenteem seus museus históricos, como, o Museu Militar Conde de Linhares, e o Museu de Astronomia e Ciências Afins. A Quinta da Boa Vista abriga o Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro, sua biblioteca e o Jardim Zoológico do Rio de Janeiro.
Recentemente estive em São Cristóvão. Muito diferente daquele bairro bucólico e tranquilo, que lembrava uma cidade do interior. É o passar dos anos e sua inexorável adaptação à marcha dos tempos. Muitas empresas, muitos restaurantes, Bancos, Supermercados, é a novela da vida que continua, com seus novos protagonistas. O Largo da Cancela não tem mais ninguém esperando o bonde, o Instituto Cylleno, ao que parece, fechou. Restam as lembranças. Revitalização é a palavra de ordem...Tomara. Personagens anônimos desta época: Marden, Soroco,  Joaquim Henriques, cracassos de bola; Caldeira, Torrado, Bacalhau, os dois filhos do Dr. Lima Neto, meu vizinho, Moacir e Murilo: O José Albino, o Zé Henriques a Elza, a Mirian, o Eduardo, o Joel, o Carlos (galinha) o Francisquinho, que era filho do dono de um Armazem de "Secos e Molhados" no Cais do Porto. Todos personagens que de alguma maneira participaram daquela época, cheia de sonhos e esperanças.
 "Se chorei ou se sorri, oimportante é que emoções eu vivi"...(Nelio Barbosa Horta)