quinta-feira, 5 de maio de 2016

Orlando Abrunhosa: lembranças (e saudades) de um amigo

por NILTON RICARDO

Orlando Abrunhosa. Foto: Reprodução Facebook Hy Brazil Filmes
Toda a imprensa estava à espreita, havia uma semana, na tentativa de fotografar o Comandante Aragão, Chefe da Polícia Militar, detido na Embaixada da  Argentina. Vivia-se um regime duro, pós-golpe de 64. "Tempos difíceis, em que não existiam filmes de alta sensibilidade e as pesadas câmeras Rolleyflex acabavam com qualquer clima intimista que o fotógrafo desejasse imprimir", lembra o fotógrafo Orlando Abrunhosa. Em meio ao tumulto de máquinas fotográficas, laudas e flashes, lá estava ele, fotógrafo miúdo, com pouco mais de metro e meio de altura, à espera de uma oportunidade para fazer seu primeiro furo de reportagem.
— Eu era laboratorista da revista Manchete, mas precisei encarar muita gozação das pessoas quando disse que um dia seria um fotógrafo, recorda.
 — Precisamos de fotógrafos peitudos, que aguentem porrada, e não um cara pequenininho como você, porque todo mundo vai passar na sua frente, dizia o editor da revista. Não importava. Orlando queria o flagrante. Acabou encontrando um prédio que lhe permitiu observar o pátio da Embaixada da Argentina. De repente, apareceu o Comandante Aragão, que se sentou numa cadeira ao ar livre para ler um jornal.
— Ele virou o rosto na minha direção e eu não perdi tempo: fiz a seqüência inteira de fotos, furando toda a imprensa, entusiasma-se Orlando. Considerando-se um «fotógrafo de detalhes», Orlando se especializou em fotos que exigiam horas a fio de observação. Certa vez, ficou 48 dias fotografando um casal de rolinhas se movimentando sobre um pinheiro de Natal. O ensaio fotográfico foi publicado no Brasil e na Alemanha, em forma de diário, com texto e fotos acompanhando a seqüência de movimentos líricos dos passarinhos.
Orlandinho no México: cobertura da Copa de 1970.
Foto: Arquivo Pessoal de Orlando Abrunhosa
Gastando quase todo o seu salário na compra de substâncias químicas importadas — para aumentar a sensibilidade dos filmes —, Orlando também registrou a personalidade noturna do bairro de Copacabana, com seu vendedores de flores, pipoqueiros, futebol de praia e festivais de chope. Na década de 60, três matérias suas ganharam o Prêmio Esso: Porque o Homem Mata (uma série sobre detentos e cadeias, que se estendeu por oito números de revista); Os Frutos Proibidos (sobre o controle de natalidade); e A Verdade Sobre o Box, com textos do repórter Juvenal Portella. Mas uma das maiores alegrias de Orlando Abrunhosa foi mesmo ver uma foto sua (Pelé, Jairzinho e Tostão na Copa de 70) transformar-se em selo e entrar para a história.

7 comentários:

Jileno Sandes disse...

Vai Orlandinho, você deixa saudade e também lembranças e feitos memoráveis que nunca se apagarão.
Vai e se junte ao Nicolau Drei, Sergio de Sousa, Jader Neves, Antonio Ruddy, Paulo Reis, Juvenil de Souza, Gil Pinheiro, Indalécio Wanderlei Raimundo Costa e tantos outros companheiros formando a maior deleção celestial de fotógrafos. (Não esqueçam os crachás)

Que Deus os ilumine e guarde.
Jileno Sandes.

Cláudia Figueiredo disse...

Tantas lembranças boas, nunca serão esquecidas. Grande Orlandinho. Digo: Gigante.
Saudades de todas as matérias que fizemos juntos.
Cláudia Figueiredo

João Cordeiro Junior disse...

Grande Orlandinho, que de uma só tacada atentou contra inumeras injustiças cometidas nos piores anos do nazismo imposto nas empresas Bloch, no pós morte do nosso saudoso chefe Adolfo o pequeno hitler ( jaquito) de tantas furadas decisões; Neste dia cometia uma das maiores covardias contra o corpo fotográfico da casa, o qual se utilizando de equipamento sucateado a décadas, de filmes contatos saímos atrás da cobertura do retorno dos nossos craques campeões(era Romario) e após saber que eu ( João Cordeiro Junior) escalado com 40 GRAUS DE FARINGITE tendo sido pego em casa, e mesmo assim me deslocado para Brasilia, sem a menor infra estrutura para tal cobertura, trazendo na bagagem, simplesmente a capa da edição historica e seis paginas duplas,e de quebra a célebre foto do Romário com a bandeira brasileira na janela da cabine do avião, acabara de ser demitido, retirou toda a paginação de cima das mesas de vidro e os guardou.
Quando indagado, aos berros, pelo Jaquito, respondeu... foram junto com seu autor,olhe bem Jaquito você pode ser o dono aqui, mas o reconhecimento profissional destes heróis os quais são hoje seus funcionários, eu não poderei deixar de reconhecer... Sendo assim, ao demiti lo você passou a não dispor mais do fruto do esforço dele!
Quando o Jaquito, bagunçado como sempre foi, exclamou... então manda embora todo mundo menos ele!!!! E o resto está na historia desta gigantesca empresa de formidaveis profissionais, como ele Orlando Abrunhosa, de onde me orgulho de ter feito parte!!!!

Elpídio disse...

Um profissional competente e um homem honesto e digno. Que Deus o tenha em seus braços.

F. Hoffmann disse...

Como admirador da fotografia, saúdo o fotógrafo Orlando Abrunhosa. Assim como a Manchete, um grande escola de talentos.

Viegas disse...

Vá em paz e com Deus, Orlandinho, o seu caminho está aberto e florido pelo bom homem que você foi em vida. O ódio e a revolta nunca tiveram espaço no seu coração

Nilton Muniz disse...

Perdemos todo: a fotografia, um craque incontestável. E nós, um ser humano maravilhoso, desses que a gente se afeiçoa ao primeiro contato. Assim guardarei comigo as boas lembranças do convívio habitual - ele, Esmeraldo, Genilson Gonzaga(?) os saudosos Renato Sérgio e Alberto e até o Cony, vez ou outra - e tudo derivava em bons papos no Hotel Novo Mundo ás sextas feiras à noite. Bons tempos. Descanse em paz, Orlandinho.